O Salmo
23 é uma parábola e contêm várias figuras. O cálice transbordante é símbolo de
alegria ou de ignominia? A mesa preparada propõe reconciliação com o inimigo,
ou aponta para a vítima da festa? A parábola tem em vista um rebanho, ou é uma
profecia acerca de uma ovelha específica? O Salmo 23 só ganha sentido quando
analisado sob o prisma da vítima perfeita escolhida e preservada por Deus: o
Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo: "Mas
Jesus disse a Pedro: Põe a tua espada na bainha; não beberei eu o cálice
que o Pai me deu?" ( Jo 18:11 ).
- O SENHOR é o meu pastor, nada me faltará.
- Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas.
- Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome.
- Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam.
- Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda.
- Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do SENHOR por longos dias.
Introdução
À época
de Jesus, os judeus liam diariamente as Escrituras porque entendiam que elas
contêm vida eterna, porém, quando a vida eterna que estava junto ao Pai se
manifestou, rejeitaram o Verbo da vida ( 1Jo 1:1 -2; Rm 2:20 ). É neste
contexto que Jesus disse: "Examinais as
Escrituras, porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de mim
testificam" ( Jo 5:39 ).
Para analisar
o Salmo 23, seguiremos a orientação de Jesus: “São elas (as Escrituras) que
de mim testificam”, ou seja, os salmos, os profetas e a lei apresentam o
testemunho de Cristo “E disse-lhes: São estas as
palavras que vos disse estando ainda convosco: Que convinha que se cumprisse
tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e nos profetas e nos Salmos”
( Lc 24:44 ).
O
salmista Davi era profeta e os seus cânticos são profecias acerca de Cristo em
forma de poesia ( Mc 12:36 ; At 2:30 e 1Cr 25:1 ).
O Salmo
23 nos faz lembrar que todos os que creem em Cristo são ovelhas do Seu rebanho,
porém, diferente do que muitos foram condicionados a pensar, o Salmo 23 não
apresenta a expressão de um rebanho de ovelhas, antes é a expressão de
confiança de uma ovelha específica: ‘O Senhor é o meu pastor...’, e não
o Senhor é o ‘nosso’ pastor.
O segredo
para interpretar as figuras e os enigmas do Salmo 23 está em descobrir quem é a
pessoa que expressa tamanha confiança em Deus. Como o salmo 23 não foi composto
da perspectiva de um rebanho, antes apresenta a perspectiva de uma única
ovelha, devemos responder a pergunta feita pelo eunuco da rainha de Candace: "E, respondendo o eunuco a Filipe, disse: Rogo-te, de
quem diz isto o profeta? De si mesmo, ou de algum outro?" ( At 8:34
).
Através
da exposição de Filipe fica claro que um profeta não profetiza acerca de si
mesmo. Como profeta, Davi não foi diferente de Isaias, ambos profetizavam
acerca do Messias. Para descobrir quem é a pessoa que assume a condição de
ovelha confiante em Deus é essencial visualizar os salmos como profecias que
apresentam aspectos da vida, morte e ressurreição de Cristo.
Há um
aspecto essencialmente importante a se considerar antes de interpretar o Salmo
23: a vítima da festa. Para um cordeiro ser oferecido em holocausto, segundo a
lei, devia ter um ano de idade e sem defeito algum, portanto, para a oferta ser
agradável a Deus, o pastor devia dispensar um cuidado especial para com a
vítima.
O cuidado
do pastor era indispensável para que a ovelha chegasse à idade estabelecida sem
qualquer defeito como cegueira, quebradura, aleijamento, verrugas, sarnas,
impigens, etc. "O cordeiro, ou cabrito, será sem
mácula, um macho de um ano, o qual tomareis das ovelhas ou das cabras"
( Êx 12:5 ).
Diante da
necessidade e do volume de oferendas pela expiação, as ovelhas para o
sacrifício tinham que receber cuidados especiais para não faltar vítimas de um
ano e sem defeito. O cuidado do pastor era indispensável para que a ovelha
estivesse à altura da sua missão: posta como vítima da festa para expiação ( Nm
6:14 ).
Deus
escolheu Cristo como a vítima da festa a ser atada sobre o altar ( Sl 118:27 ),
concomitantemente, o Cordeiro de Deus recebeu um cuidado específico e efetivo
para cumprir a missão do Sumo Pastor, que colocou a alma de Cristo por expiação
dos pecados da humanidade ( Is 53:10 ).
O Salmo
23 apresenta o Cordeiro de Deus sob cuidado do Sumo Pastor, pois Ele foi
enviado como a vítima para o sacrifício perfeito ( Is 53:7 ). Muitos,
equivocadamente, buscam e pedem a proteção exarada no Salmo 23, porém, não
atinam que a proteção nele descrita tem em vista um cálice "Jesus, porém, respondendo, disse: Não sabeis o que
pedis. Podeis vós beber o cálice que eu hei de beber, e ser batizados com o
batismo com que eu sou batizado? Dizem-lhe eles: Podemos" ( Mt
20:22 ).
O salmo
23 é uma parábola, e como parábola contém várias figuras que compõe um enigma.
Primeiro desvendaremos as figuras que compõe o enigma e, ao final da releitura
do Salmo 23, apresentaremos o significado da parábola.
“O SENHOR é o meu pastor, nada me
faltará” (v. 1)
Temos
neste verso uma expressão de confiança: O Senhor é o meu pastor, e, em seguida,
uma conclusão: nada me faltará. Como poesia, há nesta frase do Salmo um
paralelismo sintético construtivo ou formal, em que a segunda parte da frase
amplia ou acrescenta nova ideia a asserção anterior.
Vale
destacar algumas nuances linguísticas pertinentes à segunda assertiva da frase
‘... nada me faltará’. Segundo os linguistas que trabalham o hebraico, o
verso 1 do Salmo 23 pode ser traduzido por: “O Senhor é pastagem”, isto porque
o termo ‘pastagem’ no hebraico assemelha-se ao possessivo ‘meu pastor’ por
possuírem radicais idênticos com sutil diferença quanto aos pequenos sufixos e
pontuações.
Para uma
interpretação segura, vale lançar mão de outro salmo. O Salmo 16, verso 2 e 5,
assim reza: “A minha alma disse ao SENHOR: Tu és o meu
Senhor. Não tenho outro bem além de ti (...) O SENHOR é a porção da
minha herança e do meu cálice” ( Sl 16:2 e 5; Sl 142:5 ). A ênfase dos
versos está em Deus, que é ‘bem’, ‘herança’ e ‘cálice’, figuras que não têm
conotação de bens materiais.
Neste
diapasão, concordo com alguns linguistas que entendem que o termo traduzido por
‘nada’ é uma adaptação linguística dos tradutores, e quando sugerem ser mais
conveniente traduzir o verso por: “O Senhor é o meu pastor, não faltará a
mim” (v. 1 ; Sl 23:4 ). Deste modo o verso enfatiza o cuidado perene de
Deus, e não o patrocínio de bens materiais ou status deste mundo.
“Deitar-me faz em verdes pastos,
guia-me mansamente a águas tranquilas” (v. 2)
Após
declarar que o Senhor é pastor, o salmo 23 apresenta algumas figuras que
representam o cuidado provedor de Deus para o homem que se posiciona confiante
diante de Deus, como uma ovelha se sujeita ao cuidado de um pastor.
‘Pastos
verdejantes’ e ‘águas tranquilas’ é tudo o que uma ovelha necessita, de modo
que são figuras para retratar o cuidado de Deus.
A nação
de Israel foi preparada para trazer o Cristo ao mundo, de modo que foi
concedido a Israel a adoção de filhos, a glória, as alianças, a lei, o culto e
as promessas ( Rm 9:4 ; Dt 4:8 ). Um retrato perfeito da missão dada a Israel
vê-se na visão de João que consta no livro de Apocalipse, capítulo 12, onde é
narrado através de um parábola o resumo da história do povo de Israel,
demonstrando que uma mulher (Israel) prestes a dar a luz um varão que irá reger
as nações com vara de ferro (o Filho do homem), é perseguida pelo dragão
(Satanás) “E deu à luz um filho homem que há de reger
todas as nações com vara de ferro; e o seu filho foi arrebatado para Deus e
para o seu trono” ( Ap 12:1 -17 ).
Apesar da
apostasia dos lideres e do povo de Israel, ao outorgar a lei e o testemunho dos
profetas, Deus estabeleceu um pasto verdejante para o Cristo. A linhagem de
Cristo recebeu proteção especial, sendo necessário a inclusão de duas mulheres
gentílicas, Rute e Raabe, para que o Cristo viesse ao mundo. Por sua vez, a
nação de Israel quase é exterminada, mas Deus a protegeu ( Et 3:13 ; Sl 22:9
-10).
O
apóstolo Paulo ensinou que Deus não tem cuidado de bois, quando disse: "Porque na lei de Moisés está escrito: Não atarás a
boca ao boi que trilha o grão. Porventura tem Deus cuidado dos bois?"
( 1Co 9:9 ), de modo que o Salmo 23 não faz referencia a animais de rebanho,
como bois e ovelhas, antes diz de um homem que confia no cuidado que Deus
dispensa a Ele.
A ênfase
do Salmo 23 está no cuidado de Deus como Sumo Pastor, o homem que figura como
ovelha é parte coadjuvante!
‘Pastos
verdejantes’ e ‘águas tranquilas’ são figuras que rementem à vontade de Deus
revelada na sua palavra, que é alimento, água e vida "E
te humilhou, e te deixou ter fome, e te sustentou com o maná, que tu não
conheceste, nem teus pais o conheceram; para te dar a entender que o homem não
viverá só de pão, mas de tudo o que sai da boca do SENHOR viverá o homem"
( Dt 8:3 ).
Alimentar-se
de maná (pão) não trouxe vida ao povo de Israel, antes é o comer da palavra de
Deus que dá vida ao homem "Este é o pão que
desceu do céu; não é o caso de vossos pais, que comeram o maná e morreram; quem
comer este pão viverá para sempre" ( Jo 6:58 ).
Apesar de
Israel abrigar a vinda do Messias ao mundo, estava como ovelha sem pastor, o
que contrasta com a condição do homem do salmo 23, que tem Deus como pastor em
função da sua total confiança na fidelidade de Deus.
O povo de
Israel foi levado cativo por falta de entendimento, ou seja, não gozaram do
cuidado de Deus, antes estavam famintos e sedentos. A falta de conhecimento de
Deus resulta em sede e fome, o que demonstra que ter o Senhor como pastor é o
mesmo que ser farto do conhecimento de Deus.
Estar em
pastos verdejantes e com águas tranquilas é estar pleno de entendimento "Portanto o meu povo será levado cativo, por falta de
entendimento; e os seus nobres terão fome, e a sua multidão se secará de
sede" ( Is 5:13 ); "Eis que vêm dias,
diz o Senhor DEUS, em que enviarei fome sobre a terra; não fome de pão, nem
sede de água, mas de ouvir as palavras do SENHOR" ( Am 8:11 ; Ez
34:1 -15).
Enquanto
era dito às ovelhas desgarradas que andavam sem pastor: "Assim diz o SENHOR: Ponde-vos nos caminhos, e vede, e perguntai
pelas veredas antigas, qual é o bom caminho, e andai por ele; e achareis
descanso para as vossas almas; mas eles dizem: Não andaremos nele"
( Jr 6:16 ), a ovelha sob cuidado do Senhor tinha a certeza de que a sua alma
seria restaurada ( Sl 62:1 ).
A ovelha
sob cuidado do Senhor de nada tem falta, pois se alimenta da palavra de Deus, o
que contrasta com a condição dos filhos dos leões (lideres de Israel que
devoravam o povo como se fosse pão) que necessitam e passam fome "A minha alma está entre leões, e eu estou entre
aqueles que estão abrasados, filhos dos homens, cujos dentes são lanças e
flechas, e a sua língua espada afiada" ( Sl 57:4 ; Sl 34:10 ;
Sl 53:4 ; Is 28:14 ).
Os
lideres de Israel são nomeados ‘loucos’, ‘néscios’, ‘faltos de entendimento’
por rejeitarem a palavra de Deus, a comida que livra da destruição “Os loucos, por causa da sua transgressão, e por causa das
suas iniquidades, são aflitos. A sua alma aborreceu toda a comida, e chegaram
até às portas da morte. Então clamaram ao SENHOR na sua angústia, e ele os
livrou das suas dificuldades. Enviou a sua palavra, e os sarou; e os livrou da
sua destruição” ( Sl 107:17 -20).
O corpo
depende de alimento cotidiano, e a alma da palavra de Deus, de sorte que quem
ouve a palavra de Deus come o que é bom ( Is 55:2 ); “Pois
fartou a alma sedenta, e encheu de bens a alma faminta” ( Sl 107:9
).
No salmo
57 temos uma profecia acerca de Cristo quando abrigado sob a sombra das asas do
Pai ( Sl 57:1 ; Sl 91:1 ). O salmo descreve que Deus envia a sua misericórdia e
a sua verdade para livrar o Messias daqueles que procuravam matá-lo ( Sl 57:3
-4); "Ó Deus, quebra-lhes os dentes nas suas
bocas; arranca, SENHOR, os queixais aos filhos dos leões" ( Sl 58:6
; Sl 23:6 ).
Como Deus
é apresentado como pastor, e a ovelha uma figura que representa um homem sob o
cuidado de Deus, ‘pastagem’ e ‘águas tranquilas’ não diz de roupas, casas,
carros, casamentos, alimento, antes diz da justiça de Deus proveniente da Sua
palavra.
O pasto e
as águas que Deus providencia tem por alvo os que têm sede e fome de justiça,
ou seja, de ouvir a palavra de Deus "Bem-aventurados
os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos" ( Mt
5:6 ); "Eis que vêm dias, diz o Senhor DEUS, em
que enviarei fome sobre a terra; não fome de pão, nem sede de água, mas de
ouvir as palavras do SENHOR" ( Am 8:11 );
"Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão? E o produto do vosso
trabalho naquilo que não pode satisfazer? Ouvi-me atentamente, e comei o que é
bom, e a vossa alma se deleite com a gordura" ( Is 55:2 ).
O
descanso e o refrigério só são possíveis quando se dá ouvido à palavra de Deus,
que é doutrina e conhecimento “Ao qual disse: Este é o
descanso, dai descanso ao cansado; e este é o refrigério; porém não quiseram
ouvir” ( Is 28:12 ; Is 28:9 ).
Os
mestres de Israel tropeçaram quando interpretavam os profetas e a lei
considerando-se filhos de Abraão por serem descendentes da carne de Abraão. Não
consideraram que só os crentes que detém a mesma fé que crente Abraão são
filhos de Abraão, pois a Abraão foi anunciado o Cristo e ele creu. Quando
Cristo veio esses mestres tropeçaram na pedra que Deus estabeleceu e a mesa
(doutrina) deles se tornou em laço, de modo que perseguiram o aflito de Deus “Torne-se-lhes a sua mesa diante deles em laço, e a
prosperidade em armadilha. Escureçam-se-lhes os seus olhos, para que não vejam,
e faze com que os seus lombos tremam constantemente. Derrama sobre eles a tua
indignação, e prenda-os o ardor da tua ira. Fique desolado o seu palácio; e não
haja quem habite nas suas tendas. Pois perseguem àquele a quem feriste, e conversam
sobre a dor daqueles a quem chagaste. Acrescenta iniquidade à iniquidade deles,
e não entrem na tua justiça” ( Sl 69:22 -27 ; Is 28:8 ; Is 43:27 ).
É por
isso que Jesus disse: "Adverti, e acautelai-vos
do fermento dos fariseus e saduceus" ( Mt 16:6 ), pois a mesa deles
era um laço: "Então compreenderam que não dissera
que se guardassem do fermento do pão, mas da doutrina dos fariseus"
( Mt 16:12 ).
Israel
não se alimentou do pasto e das águas tranquilas providenciadas por Deus, antes
se assentavam em uma mesa plenas de vômitos e imundícias, uma mesa que não
continha o conhecimento de Deus “Porque todas as suas
mesas estão cheias de vômitos e imundícia, e não há lugar limpo” ( Is
28:8 ; Is 65:11 ).
Embora os
filhos de Jacó fossem os guardiões da lei e do testemunho dos profetas, eles
não davam ouvidos à palavra de Deus “Assim diz o
SENHOR: Ponde-vos nos caminhos, e vede, e perguntai pelas veredas antigas, qual
é o bom caminho, e andai por ele; e achareis descanso para as vossas almas; mas
eles dizem: Não andaremos nele" ( Jr 6:16 ).
“Refrigera a minha alma; guia-me
pelas veredas da justiça, por amor do seu nome” (v. 3)
O verso 3
complementa a ideia do verso 2:
“Deitar-me
faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas” (v. 2)
“Refrigera
a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome” (v. 3)
O
alimento providenciado por Deus proporciona descanso, refrigério e restaura a
alma aflita, pois é Ele quem guia as águas tranquilas, ou seja, pelas veredas
da justiça "A lei do SENHOR é perfeita, e
refrigera a alma; o testemunho do SENHOR é fiel, e dá sabedoria aos
símplices" ( Sl 19:7 ).
O cuidado
do Senhor está atrelado ao zelo do Seu nome, pois Ele é fiel “Porque tu és a minha rocha e a minha fortaleza; assim, por
amor do teu nome, guia-me e encaminha-me” ( Sl 31:3 ).
As
vicissitudes do mundo fazem parte da existência do homem, quer seja salvo ou
não ( Jo 16:33 ; Ec 7:14 ), pois foi Deus quem estabeleceu como consequência da
ofensa de Adão que o homem se sustentaria (comerá) do suor do seu rosto até
retornar ao pó ( Gn 3:19 ). É um erro pensar que os salmos possuem poderes
místicos para livrar o homem dos problemas diários.
“Ainda que eu andasse pelo vale da
sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o
teu cajado me consolam” (v. 4)
A
confiança da ‘ovelha’ no Sumo Pastor pode ser dimensionada através da
circunstância que o cerca: “Ainda que eu andasse pelo
vale da sombra da morte, não temeria mal algum...”. O motivo de tamanha
confiança vem expresso no Salmo 138: “Andando eu no
meio da angústia, tu me reviverás; estenderás a tua mão contra a ira dos meus
inimigos, e a tua destra me salvará” ( Sl 138:7 ).
A
penalidade decorrente da ofensa de Adão impôs medo a todos os homens, mas a
‘ovelha’ em comento não teme mal algum ao percorrer as ‘regiões da morte’, pela
certeza de que Deus, como Pastor, jamais faltará (v. 1; Hb 2:15 ). Deus é o
Pastor da ‘ovelha’ porque ela não pertence ao pecado como os demais homens.
A ‘sombra
da morte’ é uma figura para fazer referencia ao mundo dos homens que jazem
separados de Deus, ou seja, estão mortos, alienados de Deus “Alguns se assentam nas trevas e nas sombras da morte,
presos de aflição e em ferro, por se haverem rebelado contra as palavras de
Deus, e desprezado o conselho do Altíssimo (...) Tirou-os das trevas e das
sombras da morte e quebrou as suas cadeias” ( Sl 107:10 -11 e 14; Is
9:2 ).
Esta
mesma figura é utilizada pelo profeta Isaias quando faz referencia a Cristo
como a luz dos povos “O povo que andava em trevas,
viu uma grande luz, e sobre os que habitavam na região da sombra da morte
resplandeceu a luz” ( Is 9:2 ).
A
humanidade alienada de Deus habita na região da sombra da morte e estão presos
por causa da lei que diz: ‘certamente morreras’ ( 1Co 15:56 ). Mas Cristo foi
dado como luz dos que jazem em trevas, tirando-os da prisão "Para abrir os olhos dos cegos, para tirar da prisão os
presos, e do cárcere os que jazem em trevas" ( Is 42:7 ); "Para dizeres aos presos: Saí; e aos que estão em
trevas: Aparecei. Eles pastarão nos caminhos, e em todos os lugares altos
haverá o seu pasto" ( Is 49:9 );
"Venha perante a tua face o gemido dos presos; segundo a grandeza do teu
braço preserva aqueles que estão sentenciados à morte" ( Sl 79:11
); "Para ouvir o gemido dos presos, para soltar
os sentenciados à morte" ( Sl 102:20 ).
‘Sombra’
é uma figura que pode representar proteção, abrigo, ou o que é efêmero,
passageiro, ou uma imagem desfocada ( Gn 19:8 : Jz 9:15 ; Sl 17:8 ; Jó 8:9 ; Jó
14:2 ; Sl 102:11 ; Hb 10:1 ). O versículo 4 do Salmo 23 faz referencia à
condição do homem que está no mundo apenado com a morte em decorrência da
ofensa de Adão.
Por causa
da ofensa de Adão toda a humanidade passou à condição de mortos para Deus, a
retribuição decorrente da ofensa ( Rm 5:15 ).
Deus é
vida, e o homem alienado de Deus está morto. Deus é luz, e o homem separado de
Deus é trevas. Como a humanidade está morta em delitos e pecados (jaz no
maligno), todos os homens residem à sombra da morte, visto estarem alienados de
Deus.
Para
resgatar a humanidade que estava em trevas, Cristo foi introduzido no mundo, à
sombra da morte, de modo que Ele é o Sol nascente das alturas que brilhou sobre
a humanidade “E a luz resplandece nas trevas, e as
trevas não a compreenderam” ( Jo 1:5 ) “Para
iluminar aos que estão assentados em trevas e na sombra da morte; A fim
de dirigir os nossos pés pelo caminho da paz” ( Lc 1:79 ).
Quando o
homem crê em Cristo é arrancado do reino da morte e transportado para o reino
do Filho do amor de Deus ( Cl 1:13 ); “Então clamaram
ao SENHOR na sua angústia, e os livrou das suas dificuldades. Tirou-os das
trevas e sombra da morte; e quebrou as suas prisões. Louvem ao SENHOR pela sua
bondade, e pelas suas maravilhas para com os filhos dos homens. Pois quebrou as
portas de bronze, e despedaçou os ferrolhos de ferro” ( Sl 107:13 -16).
Mas a
profecia é mais especifica: “Ainda que eu andasse pelo
vale da sombra da morte...” (v. 4). A sombra da morte
refere-se à humanidade alienada de Deus, o vale refere-se aos filhos de Jacó
que não se deixam alcançar pela luz.
O profeta
Jeremias nomeia os filhos de Jacó como a ‘moradora do vale’, ‘pedra da campina’ “Eis que eu sou contra ti, ó moradora do vale, ó rocha da
campina, diz o SENHOR; contra vós que dizeis: Quem descerá contra nós? Ou quem
entrará nas nossas moradas?” ( Jr 21:13 );
"Por isso farei de Samaria um montão de pedras do campo, uma terra de
plantar vinhas, e farei rolar as suas pedras no vale, e descobrirei os seus fundamentos"
( Mq 1:6 ).
Quando
João Batista passou a clamar no deserto da Judéia dizendo: - “Arrependei-vos”,
buscava cumprir a sua missão: aplainar o caminho do Senhor. Era imprescindível
uma mudança de concepção acerca de como ser salvos, abandonando as veredas não
aplainadas por Deus ( Is 40:2 -3 ; Is Lc 1:76 ; "Contudo
o meu povo se tem esquecido de mim, queimando incenso à vaidade, que os fez
tropeçar nos seus caminhos, e nas veredas antigas, para que andassem por
veredas afastadas, não aplainadas" ( Jr 18:15 ).
O ‘vale’
diz dos filhos de Jacó que se opuseram a Cristo, conforme descrevem os Salmos
69, 22, 64, etc. Por que o Cordeiro de Deus não haveria de temer quando no vale
entre os leões? "A minha alma está entre leões, e
eu estou entre aqueles que estão abrasados, filhos dos homens, cujos dentes são
lanças e flechas, e a sua língua espada afiada" ( Sl 57:4 ). Porque
estaria abrigado à sombra das asas de Deus ( Sl 57:1 ; Sl 91:1 ).
Enquanto
os que habitavam nas regiões da sombra da morte viram uma grande luz, os que
estavam no vale da sombra da morte se opuseram à luz verdadeira, tornando-se
opositores da luz "Ali estava a luz verdadeira,
que ilumina a todo o homem que vem ao mundo" ( Jo 1:9 ; Jo 10:36 ).
Fazer a
vontade de Deus é ser guiado em terra aplainada, o caminho preparado por Deus "Assim diz o SENHOR: Ponde-vos nos caminhos, e vede, e
perguntai pelas veredas antigas, qual é o bom caminho, e andai por ele; e
achareis descanso para as vossas almas; mas eles dizem: Não andaremos
nele" ( Jr 6:16 ). Cristo foi guiado por terra plana “Ensina-me a fazer a tua vontade, pois és o meu Deus. O teu
Espírito é bom; guie-me por terra plana” ( Sl 143:10 ).
“Preparas uma mesa perante mim na presença dos
meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda” (v. 5).
Do verso
4 para o verso 5 ocorre uma transição de cenário, onde havia pasto e águas,
agora há uma mesa posta.
Enquanto
os versos 1 a 4 enfatizam o cuidado do Senhor e a confiança do Servo, nos
versos que se seguem, a ênfase está missão do Servo.
Os versos
de 1 a 4 destacam que o Servo do Senhor estava sob o cuidado de Deus em virtude
da missão que lhe foi confiada. Já os versos 5 a 6 destacam a finalidade do
cuidado dispensado ao homem que se posiciona como ovelha.
O cenário
do campo e das águas tranquilas é desfeito abruptamente e se volta para uma
mesa posta em um ambiente de hostilidade. A parábola do Salmo 23 e as suas
figuras ganham novo contorno: o cuidado de Deus tem em vista preservar a vítima
da festa.
O quadro
bucólico dos versos 1 a 4 (ovelha, campo, água) é substituído no verso 5 por
uma ‘mesa preparada’ que representa tanto a vontade do Sumo Pastor quanto a
satisfação do Servo eleito em realizar a vontade do seu Senhor. Através da mesa
preparada demonstra-se o prazer do Servo do Senhor em atender a vontade de
Deus.
O Servo
do Senhor destaca que Deus (o Sumo Pastor) preparou uma mesa em uma ocasião
nada favorável: na presença dos seus inimigos. Há uma mesa preparada, mas qual
é o seu significado? “Preparas uma mesa perante mim na
presença dos meus inimigos...” (v. 5).
A figura
da ‘mesa preparada’ tem a conotação de proporcionar prazer a alguém. Como o
prazer do Servo fiel é fazer a vontade de seu Senhor, a mesa preparada
representa a vontade de Deus. A mesa posta na presença dos inimigos não guarda
relação com o sustento cotidiano, antes reúne em uma mesma figura a vontade
expressa de Deus e o prazer do seu Servo.
Quando
lemos a declaração de Jesus, que diz: “... convinha
que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e nos
profetas e nos Salmos” ( Lc 24:44 ), e que a ‘comida’ de Cristo era
fazer a vontade de Deus Pai, é possível saber o que foi posto sobre a mesa “Jesus disse-lhes: A minha comida é fazer a
vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra" ( Jo 4:34 ).
O
testemunho do Salmo 23 não diz do salmista Davi, ou de qualquer outra pessoa. O
Salmo 23 é um testemunho específico acerca do Cristo, que se apresentou para
fazer a vontade de Deus “Então disse: Eis aqui venho;
no rolo do livro de mim está escrito. Deleito-me em fazer a tua vontade,
ó Deus meu; sim, a tua lei está dentro do meu coração” ( Sl 40:7 -8; Hb
10:9 ).
Tudo o
que está escrito no rolo das Escrituras testificam de Cristo, pois Ele teve
prazer em fazer a vontade de Deus. O deleite, o alimento de Cristo, era fazer o
prescrito por Deus, pois a lei de Deus é refrigério "A
lei do SENHOR é perfeita, e refrigera a alma" ( Sl 19:7 ; Sl 23:2
).
Para
identificarmos que tipo de alimento foi servido à mesa que o Senhor preparou
para o Messias não podemos ter a mesma visão dos discípulos quando pediram ao
Senhor Jesus que comesse: “E entretanto os seus
discípulos lhe rogaram, dizendo: Rabi, come. Ele, porém, lhes disse: Uma
comida tenho para comer, que vós não conheceis. Então os discípulos
diziam uns aos outros: Trouxe-lhe, porventura, alguém algo de comer?” (
Jo 4:31 -33).
É
necessário ver além! A comida de Cristo que os discípulos não conheciam
refere-se a realizar a vontade de Deus. Quando lemos: "Eu
não posso de mim mesmo fazer coisa alguma. Como ouço, assim julgo; e o meu juízo
é justo, porque não busco a minha vontade, mas a vontade do Pai que me
enviou" ( Jo 5:30 ); "Porque
eu desci do céu, não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me
enviou" ( Jo 6:38 ), percebe-se que a vida de Cristo era realizar a
vontade Deus “Não cuideis que vim destruir a lei ou os
profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir” ( Mt 5:17 ), vemos que a vida
do Messias foi alimentar-se à mesa de Deus.
Como
Cristo veio ao mundo para cumprir a vontade do Pai, a lei, os salmos e os
profetas era o alimento colocado à mesa. As escrituras é a mesa preparada que,
para o Cristo teve peso de glória porque fez a vontade do Pai, enquanto para os
filhos de Jacó a mesma mesa tornou-se ‘laço’ e ‘tropeço’ “Torne-se-lhes a sua mesa diante deles em laço, e a prosperidade
em armadilha”( Sl 69:22 ). A mesa de Deus que estava diante dos filhos
de Jacó diz da mesa mesa preparada perante o Cristo "Preparas
uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos..."
( Sl 23:5 ).
Enquanto
a descrição da vida e ministério de Cristo nas Escrituras, ou o cumprimento das
Escrituras na vida e no ministério de Cristo era a mesa preparada perante os
opressores de Cristo, o cálice diz das agruras da cruz. Quando Jesus estava no
Getsemani, começou a entristecer-se e a angustiar-se, foi quando Jesus por três
vezes fez a seguinte oração ao Pai, dizendo: “E, indo
segunda vez, orou, dizendo: Pai meu, se este cálice não pode passar de mim sem
eu o beber, faça-se a tua vontade" ( Mt 26:42 ); “A minha alma está cheia de tristeza até a morte” (
Mt 26:38 ).
O Messias
saiu do Getsemani resoluto e certo de uma coisa: “Dormi
agora, e repousai; eis que é chegada a hora, e o Filho do homem será entregue
nas mãos dos pecadores” ( Mt 26:45 ). Ele tinha plena certeza do que
Deus havia reservado "Agora a minha alma está
perturbada; e que direi eu? Pai, salva-me desta hora; mas para isto vim a esta
hora" ( Jo 12:27 ).
Quando
Cristo se entregou aos homens segundo a vontade do Pai, ali estava fazendo a
vontade de Deus na presença dos seus inimigos. Enquanto os homens contemplavam
o Cristo ser crucificado, na verdade, Cristo estava à mesa, realizando
(comendo) a vontade do Pai. Além de fazer a vontade de Deus, ao final da
‘refeição’, Jesus bebeu o cálice que Deus lhe deu "Jesus
disse-lhes: A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar
a sua obra" ( Jo 4:34 ).
Enquanto
os inimigos injuriavam e se arremetiam contra o Ungido do Senhor, Cristo estava
bebendo o cálice dado por Deus, pois era do agrado de Deus enfermá-Lo e moê-Lo "Mas Jesus disse a Pedro: Põe a tua espada na bainha;
não beberei eu o cálice que o Pai me deu?" ( Jo 18:11 ); "Ninguém ma tira de mim, mas eu de mim mesmo a dou;
tenho poder para a dar, e poder para tornar a tomá-la. Este mandamento recebi
de meu Pai" ( Jo 10:18 ); "Todavia,
ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por
expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom
prazer do SENHOR prosperará na sua mão" ( Is 53:10 ).
Cristo
sabia que, após comer à mesa posta pelo Pai (fazendo a vontade de Deus), e,
bebendo o cálice (sujeitando-se à ignomínia da cruz), receberia a recompensa "Olhando para Jesus, autor e consumador da fé, o qual,
pelo gozo que lhe estava proposto, suportou a cruz, desprezando a afronta, e
assentou-se à destra do trono de Deus" ( Hb 12:2 ).
Na cruz o
Filho estava pagando o seu voto diante dos filhos do seu povo ( Sl 116:14 e
18). Dele estava escrito: “Eis aqui venho (...)
Deleito-me em fazer a tua vontade, ó Deus meu” ( Sl 40:7 -8). É por isso
que Jesus declarava abertamente: "Porque eu desci
do céu, não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou"
( Jo 6:38 ).
“Certamente que a bondade e a
misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do
SENHOR por longos dias” (v. 6)
Apesar de
saber que Deus haveria de lhe dar um cálice a beber, a confiança do Cristo em
Deus é imutável, pois confessa: a bondade e a misericórdia certamente me
seguirão, por fim, após ser participante da mesa e do cálice tinha plena
confiança que habitará eternamente junto ao Pai.
A certeza
de que a bondade e a misericórdia de Deus e abundancia de dias decorre da
obediência de Cristo "E faço misericórdia a
milhares dos que me amam e guardam os meus mandamentos" ( Dt 5:10
). Deus havia estabelecido que teria misericórdia dos que O obedecem, e como a
comida, o prazer de Cristo era executar a vontade de Deus, a bondade e a
misericórdia de Deus era certa, de modo que Cristo foi ressuscitado dentre os
mortos ( Sl 56:13 ; Is 53:12 ; Pv 14:32 ; Sl 30:3 ; Sl 49:15 ; Sl 88:3 ).
O Servo
do Senhor é cordeiro morto desde a fundação do mundo
Como
homem, Jesus confiou inteiramente no Pai, de modo que nesta previsão escrita
por Davi ( At 2:30 ; At 4:25 ), temos o Verbo encarnado expressando a sua
confiança em Deus assim como uma ovelha entrega-se ao cuidado do Pastor.
O salmo
apresenta uma figura própria ao servo do Senhor: o cordeiro de Deus "Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a sua boca;
como um cordeiro foi levado ao matadouro, e como a ovelha muda perante os seus
tosquiadores, assim ele não abriu a sua boca" ( Is 53:7 ). Neste
salmo as figuras ‘servo’ e ‘cordeiro’ fundem-se "Quem
é cego, senão o meu servo, ou surdo como o meu mensageiro, a quem envio? E quem
é cego como o que é perfeito, e cego como o servo do SENHOR?" ( Is
42:19 ); “Mas eu, como surdo, não ouvia, e era como
mudo, que não abre a boca. Assim eu sou como homem que não ouve, e em cuja boca
não há reprovação” ( Sl 38:13 -14).
Na
condição de ovelha o Cristo teve o Pai como pastor. O que isto significa? Que o
descendente prometido a Davi assumiria a condição de servo ( Is 42:1 ; Is 49:5
), e que os servos não fazem a sua própria vontade, antes esperam inteiramente
em seu senhor "Assim como os olhos dos servos
atentam para as mãos dos seus senhores, e os olhos da serva para as mãos de sua
senhora, assim os nossos olhos atentam para o SENHOR nosso Deus, até que tenha
piedade de nós" ( Sl 123:2 ).
No Salmo
23 a relação ‘Senhor’ e ‘servo’, ‘Pai’ e ‘Filho’ é apresentada através de uma
nova figura: ‘pastor’ e ‘ovelha’. Lembremos que Deus veio em carne e habitou
entre os homens "E o Verbo se fez carne, e
habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai,
cheio de graça e de verdade" ( Jo 1:14 ). Ao assumir um corpo à
semelhança da carne do pecado ( Rm 8:3 ; HB 10:5 ), Cristo se sujeitou às
mesmas paixões que os homens ( Lc 22:28 ; Hb 4:15 ; Hb 2:17 ).
Para
cumprir a missão dada pelo Pai, o Verbo que habitava o esconderijo do Altíssimo
foi introduzido no mundo e, quando no mundo dos homens (região da sombra da
morte) esteve abrigado sob as asas do Onipotente porque em tudo foi obediente “AQUELE que habita no esconderijo do Altíssimo, à sombra do
Onipotente descansará” ( Sl 91:1 ; Is 9:2 ).
A
promessa do Pai ao Filho enquanto na região da sombra da morte era de que o
Cristo não seria deixado na morte e que nem um dos seus ossos seria quebrado (
Sl 16:10 ; Sl 49:9 ; Sl 34:20 ). As promessas de Deus são firmes, pois Ele zela
do Seu nome ( Sl 138:2 ).
É em
função do cordeiro que seria morto na plenitude dos tempos, mas que foi morto
desde a fundação do mundo, que destacamos que o Salmo 23 não foi escrito na
perspectiva de um rebanho de ovelhas, antes foi redigido na perspectiva de uma
ovelha que necessitava de proteção para ser oferecida como vitima segundo a
vontade de Deus.
Cristo –
O Bom Pastor
O salmo
23 foi analisado na perspectiva da Ovelha escolhida por Deus para beber o
cálice da ignomínia – Cristo - o Servo do Senhor ( Jo 8:15 ; Jo 12:47 ) “PORQUE brotará um rebento do tronco de Jessé, e das suas
raízes um renovo frutificará. E repousará sobre ele o Espírito do SENHOR, o
espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza,
o espírito de conhecimento e de temor do SENHOR. E deleitar-se-á no temor do
SENHOR; e não julgará segundo a vista dos seus olhos, nem repreenderá segundo o
ouvir dos seus ouvidos. Mas julgará com justiça aos pobres, e repreenderá com
equidade aos mansos da terra; e ferirá a terra com a vara de sua boca, e com o
sopro dos seus lábios matará ao ímpio, E a justiça será o cinto dos seus
lombos, e a fidelidade o cinto dos seus rins” ( Is 11:1 -5; Is 4:2 ).
Cristo, o
rebento do tronco de Jessé prometido por Deus é fonte de água que jorra para a
vida eterna ( Jo 4:14 ). Ele é o pão vivo que desceu dos céus ( Jo 6:51 ). Quem
crê em Cristo, o Verbo que se fez carne, passa a viver especificamente da
palavra que sai da boca de Deus ( Jo 6:58 ).
O tronco
de Jessé é Deus feito homem habitando com os homens (Deus conosco), e neste
quesito, Ele é o Bom Pastor que deu a sua vida pelas ovelhas ( Jo 10:11 e 14;
Is 9:6 ). Para as ovelhas, os verdes pastos e a água perene são os ensinos de
Cristo ( Ef 1:3 ; 1Co 1:5 ; 2Pe 1:3 ; Mt 28:20 ).
Jesus é o
Bom Pastor e por isso disse aos seus discípulos: "NÃO
se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim" ( Jo
14:1 ); "Enquanto tendes luz, crede na luz, para
que sejais filhos da luz. Estas coisas disse Jesus e, retirando-se, escondeu-se
deles" ( Jo 12:36 ); "Para que todos
honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que
o enviou" ( Jo 5:23 ).
No Salmo
110, Davi ‘em espírito’ chamou o Filho de Deus de ‘meu Senhor’, já no Salmo 23,
em espírito temos o Filho de Deus, na condição de Cordeiro escolhido, chamando
o Pai de pastor.
“O
SENHOR é o meu pastor, nada me faltará” ( Sl 23:1 );
“DISSE
o SENHOR ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão direita, até que ponha os teus
inimigos por escabelo dos teus pés” ( Sl 110:1 ).
Mas, na
plenitude dos tempos, o Senhor Jesus Cristo anunciou ser o Bom Pastor: "Eu sou o bom Pastor... " ( Jo 10:11 e Jo
10:14 ; Ef 1:10 ; Gl 4:4 ). Por quê? Porque o Jesus de Nazaré, que foi reputado
por aflito de Deus, antes de ser introduzido no mundo, era o Verbo eterno que
estava com Deus. Devemos enxergar o rebento de Jessé de dois modos: a) em
ignomínia; b) glorioso.
Da mesma
forma que os homens ficaram pasmos diante do Cristo crucificado, hão de ficar
pasmos diante da sua glória ( Is 52:13 -15). Num primeiro momento o renovo
justo não tinha parecer e nem formosura ( Is 53:2 ), em um tempo vindouro se
apresentará cheio de beleza ( Is 4:2 ).
Por que
Jesus utilizou o predicativo ‘bom’ ao identificar-se como Pastor? Porque Ele é
o Verbo de Deus encarnado ( Jo 1:14 ), o Deus Altíssimo ( Is 57:15 ), o Senhor
entronizado conforme prediz o Salmo 45: “O Teu trono,
ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do teu reino é um cetro de equidade. Tu
amas a retidão e odeias a impiedade; portanto Deus, o teu Deus te ungiu com o
óleo de alegria, mais do que a teus companheiros” ( Sl 45:6 -7).
Compare:
“DISSE
o SENHOR ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão direita, até que ponha os teus
inimigos por escabelo dos teus pés” ( Sl 110:1 ).
“O
Teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo (...); portanto Deus, o teu Deus te
ungiu com o óleo de alegria, mais do que a teus companheiros” ( Sl 45:6 -7).
No salmo
45 Jesus é apresentado pelo salmista no reino da sua glória, o Senhor Deus que
reina com justiça e equidade, do mesmo modo que foi apresentado no salmo 110 em
igualdade com o Pai. O escritor aos Hebreus destaca este fato: “Mas, do Filho, diz: Ó Deus, o teu trono subsiste pelos
séculos dos séculos; Cetro de equidade é o cetro do teu reino” ( Hb 1:8
).
Sem
sombras de dúvidas Jesus Cristo é o Bom Pastor, visto que, Ele e o Pai são um: "Eu e o Pai somos um" ( Jo 10:30 ).
A relação
‘Pai’ e ‘Filho’ não existia na eternidade, pois as pessoas da divindade na
eternidade são co-iguais e co-eternas. Somente quando o Verbo foi introduzido
no mundo, passou a ter eficácia o acordo estabelecido na eternidade, como se
lê: "Porque, a qual dos anjos disse jamais: Tu és
meu Filho, Hoje te gerei? E outra vez: Eu lhe serei por Pai, e ele me será por
Filho?" ( Hb 1:5 ).
Na
eternidade não havia a relação Pai e Filho, mas ao ser introduzido o Unigênito
no mundo, ficou estabelecido: ‘Eu lhe serei por
pai, e tu me será por Filho’. O termo ‘hoje’ utilizado em algumas
profecias refere-se a eventos pertinentes ao mundo dos homens.
Os que
recebem a Cristo estão sob a proteção do Bom Pastor, de modo que em tudo os que
creem em Cristo têm toda suficiência, ou seja, de '... nada têm falta'! "Temei ao SENHOR, vós, os seus santos, pois nada falta
aos que o temem" ( Sl 34:9 ; 2Co 9:8 ).
Há os que
pensam que a promessa de que ‘nada faltará’ àqueles que têm a Cristo como
Senhor lhes proporcionará farturas de bens materiais aqui neste mundo, porém,
estão equivocados em suas mentes carnais. O apóstolo Paulo explica que Deus é
poderoso para fazer abundar toda graça com o objetivo de que os cristãos tenham
sempre, em tudo, toda suficiência.
Os
cristãos terão fartura (abundeis) em toda boa obra, e não em riquezas
materiais. Com relação aos bens materiais, será agraciado com suficiência em
tudo. Mesmo no pouco, o cristão possui suficiência, contentamento ( 1Tm 6:6 ).
Aquele
que tem Cristo como Pastor (meu), é ovelha do seu aprisco "As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as,
e elas me seguem" ( Jo 10:27 ). Entram no aprisco do Senhor e encontraram
paz e descanso para a suas almas ( Mt 11:29 ), porém, as aflições deste mundo
persistem ( Jo 16:33 ).
Jesus
anunciou ser:
- A Porta – ‘Eu sou a porta’ ( Jo 10:9 ) – Ou seja, Cristo é a porta das ovelhas, pela qual os homens que ouvirem a sua voz necessitam entrar para serem salvos ( Mt 7:13 );
- O Bom Pastor ( Sl 10:11 ) - ‘Eu sou o bom Pastor’ ( Jo 10:11 ) – Aquele que dá a sua vida em prol das ovelhas.
Aqueles
que entram por Cristo, a porta estreita, são comparados a ovelhas, visto que o
Pastor é quem guia pelas veredas eternas. Ora, qualquer que entra pela porta
estreita que é Cristo, está num caminho estreito que o conduz a vida eterna “Mas estreita é a porta, e apertado o caminho que conduz
para a vida...” ( Mt 7:14 ), e encontra descanso para a alma ( Mt 11:29
; Sl 118:20 ).
A figura
do ‘caminho apertado’ quanto a o ‘Bom Pastor’ é Cristo, visto que:
- ‘o caminho apertado’ conduz o homem a Vida, e;
- O Bom Pastor conduz ‘as ovelhas’ as águas tranquilas.
Qualquer
que crê em Cristo de nada tem falta e alcança o descanso prometido. Aquele que
confia em Cristo encontra descanso, conforme o escritor aos Hebreus escreveu: “Ora, nós que temos crido, entramos no descanso...” (
Hb 4:3 ). Após crer no Bom Pastor, que é Cristo Jesus, as suas 'ovelhas'
descansam, pois é Ele quem guia as 'ovelhas' em segurança à vida eterna "Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou
manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas"
( Mt 11:29 ).
A
confiança em Cristo como pastor proporciona aos seus seguidores descanso,
segurança e refrigério. Tal condição é descrita pelo apóstolo Paulo como ‘estar
assentado’ em Cristo Jesus nas regiões celestiais ( Ef 1:3 ).
Jesus, o
Bom Pastor, é o caminho de Justiça que conduz os homens a Deus "Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a
vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim" ( Jo 14:6 ). Somente
trilham o novo e vivo caminho aqueles que são nascidos da água (palavra) e do
Espírito (Deus) ( Hb 10:20 ).
Todos
quantos tem o Senhor Jesus como Pastor são crucificados, morrem e são
sepultados com Cristo "Porque este Deus é o nosso
Deus para sempre; ele será nosso guia até à morte" ( Sl 48:14 ; Rm
6:6 ), porém, ressurgem vitoriosos em Cristo, sendo criados de novo em
verdadeira justiça e santidade ( Cl 3:1 ).
As palavras
do Pastor, a verdade do evangelho, desempenham a função da vara e do cajado:
guia, correção e consolo ( Jo 10:4 ; Jo 5:24 ). É o Senhor quem peleja em favor
daqueles que creem no bom Pastor ( Ex 14:14 ). Quantos inimigos o Senhor Jesus
derrotou na sua morte? O mundo, a carne, o pecado, satanás e as potestades, de
modo que, os seus seguidores são mais que vendedores!
Por
desconhecer que os salmos são profecias em forma de cânticos e poesias, e que
tais profecias têm por tema o Cristo e a sua obra, muitos buscam proteção nas
promessas contidas nos salmos. Se as pessoas buscassem nos salmos o
conhecimento do Santo, encontrariam proteção e descanso para a alma, pois
encontrariam a salvação de Deus em Cristo “E DAVI,
juntamente com os capitães do exército, separou para o ministério os filhos de
Asafe, e de Hemã, e de Jedutum, para profetizarem com harpas, com címbalos, e
com saltérios; e este foi o número dos homens aptos para a obra do seu
ministério” ( 1Cr 25:1 ).
Se os
leitores dos salmos compreenderem que as promessas dos salmos dizem do Messias,
e que por Ele ser o ungido do Senhor, que Deus reservou para o Cristo um cálice
a beber, não teriam uma visão superficial dos salmos.
Na sua
maioria, os leitores dos salmos querem ‘se assentar à direita e a esquerda do
Cristo em seu reino’, porém, desconhecem, como os filhos de Zebedeu, que o
cálice que Cristo ia beber era derramar a sua alma na morte "Jesus, porém, respondendo, disse: Não sabeis o que
pedis. Podeis vós beber o cálice que eu hei de beber, e ser batizados com o
batismo com que eu sou batizado? Dizem-lhe eles: Podemos" ( Mt
20:22 ).
Para
alcançar as promessas de Deus é essencial que o homem beba o cálice dado pelo
Pai: crer em Cristo. Quando o homem crê em Cristo, significa que pegou a sua
própria cruz e seguiu após Cristo até o calvário, foi morto, sepultado e
ressurgiu segundo o poder de Deus. Aquele que crê que Cristo, o Jesus de
Nazaré, é o Bom Pastor, bebeu o cálice de Cristo “E
diz-lhes ele: Na verdade bebereis o meu cálice e sereis batizados com o batismo
com que eu sou batizado, mas o assentar-se à minha direita ou à minha esquerda
não me pertence dá-lo, mas é para aqueles para quem meu Pai o tem preparado”
( Mt 20:23 ).
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