por Rick Phillips | 09 de julho de 2015
Muitos comentaristas cristãos estão
preocupados com a tendência antinomista na igreja. Temos visto, em
particular, a tentativa de se minimizar o papel da Lei de Deus como guia
para a vida cristã (o chamado terceiro uso da lei). Uma
pergunta que surge é se os Dez Mandamentos devem ser vistos como uma
declaração única e eterna da lei moral de Deus ou, em contraste a isso,
seriam apenas parte do diverso “escrito Mosaico”, o qual tinha a
intenção apenas de governar as vidas de um povo antigo do Oriente Médio
e, por isso, “mais ou menos inaplicável fora daquele mundo”.
Confesso que dispensar os Dez Mandamentos como guia para a vida
cristã me alarma muito, especialmente quando essa posição vem daqueles
que se afirmam cristãos reformados. Além disso, as premissas para essa
manobra são muito fracas ao meu ver. Em resumo, os Dez Mandamentos são
primeiramente declarados indistinguíveis de outras leis e preceitos dos
escritos de Moisés, como os que regulam o que fazer quando a cabeça de
um machado voa. E, em segundo lugar, os Dez Mandamentos são relegados à
governança de apenas uma única configuração cultural e religiosa antiga
com pouco significado para os cristãos nos dias de hoje. Seria difícil
achar uma mudança com maior profundidade, não só para a doutrina cristã,
mas, também, para a nossa abordagem da vida diária como seguidores de
Cristo. Em um tempo em que a igreja sofre continuamente a pressão de se
conformar com o mundo, é difícil imaginar uma postura que possa ser mais
prejudicial à fé e ao testemunho dos crentes hoje.
Em relação a essa preocupação, eu gostaria de propor quatro
argumentos mostrando porque os Dez Mandamentos devem ser vistos como
algo separado e distinto das outras regras e regulações da economia
mosaica e porque os Dez Mandamentos estabelecem universalmente a Lei de
Deus, cuja função é guiar os crentes de todos os tempos, inclusive os de
hoje.
A forma como os Dez Mandamentos foram dados mostra-nos o seu significado especial e eterno.
Diferentemente das várias regras e regulações que preenchem as
páginas de Êxodo até Deuteronômio, os Dez Mandamentos foram dados a
Moisés diretamente por Deus, e foram escritos pelos dedos de Deus em
duas tábuas de pedra (Êxodo 24.12; 32.16). É difícil imaginar como Deus
poderia ter feito uma declaração mais sugestiva em relação à
característica atemporal dessas dez prioridades. A circunstância na qual
os Dez Mandamentos foram dados – no topo do monte Sinai, em meio a
nuvens de tempestade e fogo (Êxodo 20.18) – também indica o status
sagrado desse conjunto de leis. Descartar o significado que Deus deu aos
Dez mandamentos não parece apenas estranho, mas, também, irreverente.
A forma como os Dez Mandamentos foram registrados no Pentateuco demonstra a primazia deles em expressar a vontade moral de Deus.
Além da maneira como os Dez Mandamentos foram dados, nós devemos
levar em conta como eles foram registrados no Pentateuco. O livro de
Êxodo mostra Israel saindo do Egito, passando pelas águas divididas do
Mar Vermelho e, finalmente, chegando ao seu destino, o Monte Sinai.
Êxodo 20, então, apresenta-nos os Dez Mandamentos como um ápice
literário na história da libertação de Israel do Egito. Eles sobem a
montanha de Deus, recebem a Lei de Deus e, então, Israel deixa a
montanha de Deus. É verdade que muitas regras e leis foram dadas, mas
nenhuma delas ocupa um lugar literário tão alto como os Dez Mandamentos.
O mesmo pode ser dito sobre a prioridade dada aos Dez mandamentos no
livro de Deuteronômio, em que ele é dado como a principal demanda da
aliança feita entre o Senhor e Israel.
A maneira como as tábuas dos Dez Mandamentos foram guardadas na
arca da aliança faz uma associação entre o seu valor moral com o caráter
de Deus.
Ninguém pode negar que a aliança mosaica, incluindo dezenas de
diferentes regras e mandamentos, contém questões sobre o culto no
tabernáculo e sobre a vida dentro da nação. Assim como o Novo Testamento
mostra, essas várias regras (as leis cerimoniais e a lei civil,
respectivamente) estão amarradas à configuração religiosa-cultural de
Israel, no Antigo Testamento. Em contraste, o lugar de destaque dos Dez
Mandamentos é demonstrado pelo lugar onde as tábuas foram fisicamente
guardadas. A atitude de Moisés em relação à eterna lei moral pode ser
vista pelo fato de ele ter armazenado as tábuas na arca da aliança
(Deuteronômio 10.5; Hebreus 9.4). Esta era o altar de Deus e o lugar
especial da presença da glória divina na Terra. É difícil pensar em como
Moisés poderia ter dado mais importância a esse particular código
moral, atribuindo a ele não somente a configuração cultural do antigo
Israel, mas, também, a própria pessoa e caráter de Deus.
A forma como os Dez Mandamentos foram confirmados no Novo
Testamento prova a sua permanente relevância e autoridade sobre as vidas
dos cristãos na era da nova aliança.
Embora, creio eu, os argumentos acima sejam suficientes para provar o
eterno caráter dos Dez Mandamentos como a lei moral de Deus, a
aplicabilidade deles na nova aliança é demonstrada no próprio Novo
Testamento. Considere o seguinte:
a. Quando pediram a Jesus que resumisse o a Lei de Deus, ele o fez
conforme as duas tábuas dos Dez Mandamentos (Lucas 10.26-27).
Claramente, o nosso Senhor os distinguiu como a duradoura expressão da
vontade de Deus, colocada em um pedestal mais alto que as demais regras
do texto Mosaico.
b. A nova aliança foi estabelecida não como um repúdio à antiga
aliança (a Mosaica). Assim, Hebreus 8.10 repete Jeremias 31.33, cujo
texto Deus promete: “Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no
coração lhas escreverei”. O ponto dessa afirmação não é dizer que o
cristão está livre da obrigação de cumprir os Dez Mandamentos, mas que a
eterna lei moral de Deus dada a Moisés seria colocada dentro de nós,
por meio do trabalho do Espírito Santo. Em resumo, a lei a que os
cristãos devem internalizar é a mesma lei que foi externalizada nas
tábuas dos Dez Mandamentos dados a Moisés.
c. Todo os Dez Mandamentos são explicitamente confirmados no Novo
Testamento, mostrando que, diferentemente das outras regras mosaicas,
essa lei transcende o antigo contexto cultural-religioso de Israel. Os
que marginalizam os Dez Mandamentos discordam disso, mas considere a
breve lista a seguir, a qual podem ser adicionados vários outros
exemplos:
1º Mandamento: Mateus 4.10; Lucas 4.8; Mateus 6.24
2º Mandamento: Atos 15.20; Atos 17.29-30
3º Mandamento: Mateus 6.9; Mateus 15.8-9
4º Mandamento: Mateus 24.20; Atos 16.13; Hebreus 4.9
5º Mandamento: Mateus 15.3-4; Efésios 6.1-3
6º Mandamento: Marcos 10.19; Romanos 13.9
7º Mandamento: Marcos 10.11-12; 1 Coríntios 6.9
8º Mandamento: Marcos 10.19; Efésios 4.25
9º Mandamento: Mateus 15.19-20; Efésios 4.25
10º Mandamento: Romanos 7.7; Efésios 5.3
Eu entendo e agradeço aqueles que se preocupam com o perigo do
legalismo sufocar a espiritualidade dos cristãos. Mas essa legítima
consternação não só não pode marginalizar os Dez Mandamentos como não
deve fazê-lo. Quando consideramos como os Dez Mandamentos foram dados, registrados, guardados e confirmados
no Novo Testamento, nós temos de exaltar a beleza e o valor da lei
moral de Deus juntamente com Davi e Paulo, dois grandes gigantes da
antiga e da nova aliança, respectivamente. Devemos afirmar o que Davi
disse quando cantou “a lei do Senhor é perfeita e restaura a alma; o
testemunho do Senhor é fiel e dá sabedoria aos símplices” (Salmo 19.7) e
devemos concordar com Paulo quando ele, longe de deixar de lado os Dez
Mandamentos, colocou-os no mais alto da espiritualidade cristã,
declarando: “o amor é cumprimento da lei” (Romanos 13.10).
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