Recentemente, enquanto cortava o cabelo, surgiu um papo sobre igrejas e a confusão que causavam nos arredores. O gerente (que não é crente) disse o seguinte:
“Cara, passei na frente de uma igreja lá perto de casa. A porta tava aberta e lá dentro deu pra ver que tava tudo escuro, com aquelas luzes estroboscópicas e um som altão. Parecia mais uma boate! É pra ser boate ou igreja? Nem tinha cara de igreja.”
Fiquei com vergonha de estar numa posição de ter que defender algo sem defesa. Me resumi a concordar meio cabisbaixo.
A verdade é que aquela afirmação me incomodou profundamente. A questão não é tanto “Que cara deve ter a igreja?”, já que temos igrejas com diversas “caras” e essa é uma conversa para outro espaço. Mas o que me tira do sério em relação a isso é o fato de eu conhecer os argumentos por trás daquela “igreja” (ou boate, segundo o gerente). “Precisamos de uma música legal para atrair os jovens! Precisamos atrair os que não são crentes! Assim fica ‘mais fácil’ louvar, pois me sinto mais livre!”
Já ouvi todos esses argumentos antes… Mas não consigo defender nenhum deles. Aliás, não poderia discordar mais! Mas não basta discordar, apenas. Tenho que dar uma explicação.
O QUE É LOUVOR?
Antes de responder aos argumentos, temos que definir os termos. Dentre as diversas definições de louvor disponíveis, creio que esta, de Bob Kauflin, seja sucinta e bem completa:
“O louvor cristão é a resposta do povo redimido e com Deus à sua auto revelação que celebra e exalta a glória de Deus em Cristo nas nossas mentes, afetos e vontades, por meio do poder do Espírito Santo.”
Alguns pontos essenciais a destacar:
1. O NÃO CRENTE NÃO PODE LOUVAR A DEUS
O louvor é uma atividade exclusiva do povo de Deus, uma resposta à revelação do Pai, pela obra do Filho, por meio do Espírito Santo. O louvor só pode vir de um coração que reconhece a obra de Cristo e o tem como Senhor e Salvador. Fora disso, o louvor cristão simplesmente NÃO FAZ SENTIDO!
Pense no seguinte: quando louvo à minha esposa, reconhecendo, exaltando e celebrando suas virtudes e tudo que ela é na minha vida, que sentido faz isso na voz de outro? Quem é que pode, como eu, afirmar tais coisas? Ninguém! Ela é a minha esposa e o relacionamento que tenho com ela é exclusivo. Esse louvor não faria sentido na boca de mais ninguém, a não ser do marido dela.
Assim é com o povo de Deus. Como é que um coração não regenerado pode louvar a Deus pela sua obra? Não pode! Mais ainda, como é que um coração não regenerado, não alcançado pelo Espírito Santo pode sequer afirmar Cristo como Senhor e Salvador? Não pode! 1 Coríntios 12:3 diz claramente: “… ninguém pode dizer: ‘Jesus é Senhor’, a não ser pelo poder do Espírito Santo.”
2. O NÃO CRENTE NÃO QUER NADA COM DEUS
Quando afirmamos que vamos atrair alguém para o louvor, partimos do pressuposto de que há algo de atraente nele. Primeiro, o louvor cristão só faz sentido se for direcionado a Deus. Ou seja, a única atração possível no louvor tem que ser o objeto da adoração. A atração pela adoração em si ignorando o objeto da mesma é ridículo. E a verdade é que o não crente não só ignora o objeto da adoração, como o rejeita e foge dele! Romanos 1:21 e 3:10,11 deixam claros que nós todos rejeitamos a glória de Deus e não o buscamos, de maneira alguma! Ou seja, o ser humano, sem a ação do Espírito Santo para lhe converter, simplesmente não tem vontade alguma de louvar a Deus!
3. QUANDO LOUVAMOS A DEUS, O FAZEMOS PELO PODER O ESPÍRITO SANTO, E ISSO NOS TRANSFORMA COMPLETAMENTE
O louvor é uma resposta que vem pelo poder do Espírito Santo, não de nós. Nossa mente, coração e vontades mudam. Contrariamos a carne para produzir uma resposta que só pode vir pela ação do Espírito Santo. Nós reconhecemos a Deus, nós exaltamos, celebramos e temos prazer na glória de Deus somente porque o Espírito Santo mudou nossa mente e nossas afeições e vontades, completamente.
Tendo dito isso, pensemos em alguns pontos a respeito do louvor “para atrair os descrentes” e o “louvor gostoso”.
1. O LOUVOR NÃO ATRAI O NÃO CRENTE. MAS TALVEZ A MÚSICA ATRAIA… E ISSO NÃO É NECESSARIAMENTE UMA COISA BOA
Como dissemos acima, o louvor não atrai o não crente. Mas fica a pergunta para os que usam a música como instrumento para atração: a qual aspecto do louvor você está chamando a atenção? Se for para a mensagem da música (supondo que ela seja fundamentada na Palavra de Deus), então é o Espírito Santo que vai atrair, e não a execução. Aliás, a execução pode ser a pior possível, pois é o Espírito Santo que fala por meio da sua Palavra. Agora, se o não crente é atraído pelo “clima gostoso”, por que ele continua lá? Por que razão um não crente participa da exaltação daquilo que ele rejeita, de um Deus do qual ele foge?
A verdade é que, em alguns casos, ele se sente bastante à vontade simplesmente porque aquilo que deveria causar confronto e rejeição não está presente! E se ele fica pela boa música… então não faz diferença se for louvor ou não. De boa música, a rádio e as casas de show estão cheias.
2. A MÚSICA NÃO DEVE OCUPAR UM LUGAR QUE NÃO LHE PERTENCE
Um pressuposto que corre por trás disso tudo é que a música cumprirá um papel que não lhe é atribuído. A música serve ao louvor, e não o louvor à música. Quando definimos o louvor a partir da música como instrumento de atração, a colocamos num lugar que pertence à Palavra de Deus e ao Espírito Santo. Romanos 10:17 não diz “A fé vem pelo ouvir… a boa música… ou… o canto da congregação… ou a música bonita que toca.” A fé vem pelo ouvir a Palavra de Deus. Agora, se o louvor inclui letras que falam da obra de Deus, que pregam a Palavra, que citam trechos das Escrituras, aí já é outra história, pois aí é a Palavra e o Espírito que agem, não a direção musical.
3. NÃO PRECISAMOS DE UM AMBIENTE GOSTOSO POIS “É MAIS FÁCIL LOUVAR”
Primeiro: O PRAZER NÃO É UM PRINCÍPIO DE LOUVOR.
Segundo: O LOUVOR NÃO PODE SER CONDICIONAL.
Muitos falam sobre criar um clima de adoração ou facilitar o agir de Deus, o fluir do espírito. Mas a verdade é que o verdadeiro louvor é algo que necessariamente contraria a carne! Como falamos acima, o louvor é algo que vai contra a nossa natureza caída. Ou seja, muitas vezes, o nosso louvor precisa ser sacrificial e contra o nosso próprio prazer!
Há também outras perguntas que surgem: Como é um ambiente ideal para o louvor? Por acaso seria uma prisão fria e sem música? Afinal, Paulo e Silas louvaram ali, certo? E será que quando Davi diz no Salmos 34:1, “Bendirei o Senhor o tempo todo! Os meus lábios sempre o louvarão”, ele tinha em mente um ambiente específico? Será que “o tempo todo” e “sempre o louvarão” eram algo restrito a um contexto que ele deixou de fora do Salmo? Não. O ambiente ideal para o louvor é na boca de um pecador, de um coração regenerado que reconhece a Cristo como Senhor e Salvador.
O louvor pode ser prazeroso? Não, de forma alguma. Não é o louvor em si que nos traz prazer, e sim o encontro que temos com Deus em meio aos louvores, a confrontação com o nosso pecado e a paz que excede todo o entendimento que temos por meio do reconhecimento e afirmação do Filho e sua obra na cruz.
É fácil louvar? Se você entender o alto preço que foi pago e a punição que Cristo sofreu em nosso lugar, então sim, é fácil louvar. Se não for por isso, então não vai ser gelo seco, luz meio apagada e uma batida legal que vão facilitar o louvor.
O louvor não depende das nossas circunstâncias, mas sim daquilo que JÁ FOI FEITO na cruz! Logo, podemos e devemos louvar, sempre!
4. O “AMBIENTE GOSTOSO” PREGA UM FALSO EVANGELHO
Voltando à premissa de que ninguém busca a Deus: não há um ser humano sequer que não busque paz, felicidade, amor, plenitude do ser e outras palavras bonitas. E nós sabemos que encontramos tudo isso em Deus. Mas se colocamos a carroça na frente dos bois, estamos fazendo a coisa errada. Se alguém vem para a igreja e encontra Deus, ele encontrará todas essas coisas. Mas lembre-se de que o mundo rejeita a Deus. É bem capaz de alguém entrar na sua igreja com “um ambiente legal e acolhedor” e encontrar todas essas coisas, mas não Deus. E aí ele continuará tão perdido quanto no dia em que entrou.
Leve as pessoas a um encontro com Deus, não com os benefícios que esse encontro traz, somente. Pois no dia em que ela não sentir mais paz e alegria, ela continuará a sua busca em outro lugar. Mas se estiver buscando a Deus e o encontrar, aí não terá outro lugar para estar, se não ali mesmo.
Concluindo, quando colocamos a música acima da Palavra, o canto acima da confissão, o ambiente externo acima do coração quebrantado, preparamos uma tremenda cilada para descrentes, visitantes e para nós mesmos. Quando colocamos questões secundárias no lugar daquilo que é essencial, desvirtuamos e corrompemos o louvor, colocando o homem como critério e alvo da nossa adoração, e não a Deus.
Eu espero que um dia aquele gerente possa passar na frente de uma igreja e ver algo que tenha “cara de igreja”, ou seja, um ajuntamento de pecadores reunidos celebrando e cantando sobre a obra redentora do seu Senhor e Salvador. Quem sabe, ele não ouça a mensagem do Evangelho e venha a conhecer a Deus nesse dia.
Por: Andrew McAlister
Fonte: Site Cante as Escrituras