Confesso que no fundo de meu coração tenho medo de um dia vir a afastar-me de Deus e de Sua verdade.
Tenho medo, explico, porque vejo no fundo de meu coração uma tendência
constante para afastar-me de Deus. Sinto que a tentação para a
heterodoxia e para a liberação total são perigos reais que me cercam
diariamente. Vejo com muita clareza que submeter-me às Escrituras e crer
em Deus é um milagre na minha vida.
Vi a apostasia acontecer
muito de perto ao longo da minha vida. Um famoso professor de Bíblia do
Recife, que foi a pessoa que me encaminhou ao seminário, abandonou a fé
cristã depois de trair a mulher e abandoná-la com nove filhos. Eu estava
no primeiro ano! Três colegas meus de classe, no seminário, entre os
mais brilhantes da turma, hoje nem professam mais o cristianismo. Um
jovem promissor que chegou ao Evangelho por minha instrumentalidade, e
que posteriormente chegou até a estudar no L’Abri, com Francis
Schaeffer, renegou o cristianismo histórico. Uma conhecida minha, desde a
infância, que é missionária no estrangeiro, acaba de comunicar aos pais
que não é mais cristã, depois de começar a viver com um homem casado.
Líderes que conheci e admirei e segui durante os primeiros anos de minha
vida, não deixaram as denominações evangélicas, mas já não crêem mais
naquilo que me ensinaram.
Há advertências constantes nas
Escrituras contra a apostasia. Apostatar significa afastar-se da verdade
de Deus revelada nas Escrituras, como resultado de uma mudança de
pensamento, e levantar-se em rebelião aberta contra ela. O que leva uma
pessoa a fazer tudo isso, a abandonar a fé bíblica, seguir a
heterodoxia, renegar os valores morais do cristianismo e pregar a
liberação total?
Não pretendo entrar aqui na delicada questão
acerca da salvação do apóstata. Talvez noutro post eu tente esclarecer
os motivos para acreditar que um apóstata, no sentido real da palavra,
nunca foi verdadeiramente salvo. Creio na perseverança final dos santos,
dos eleitos.
O que eu gostaria é de inquirir acerca dos motivos
que levam uma pessoa a abandonar a fé histórica do Cristianismo, após
ter pregado e defendido essa fé por muito tempo. É evidente que não
poderei inquirir aqui sobre os desígnios misteriosos de Deus. A minha
inquirição é apenas psicológica, espiritual e teológica.
O Novo
Testamento nos dá vários motivos pelos quais as pessoas se desviam da
fé. Na parábola do semeador, lemos acerca dos que creram por um tempo e
depois se desviaram, por causa dos cuidados desse mundo e por causa das
perseguições que começaram a experimentar por causa do Evangelho. São
aqueles que não acolheram sinceramente a verdade para serem salvos. A
eles, o próprio Deus envia a operação do erro e da mentira (2Ts 2.9-11).
Há também os que, depois de algum tempo, passaram a dar ouvidos a
doutrinas de demônios (1Tm 4.1). Outros, se desviaram da fé para
professar uma doutrina que acharam que era mais intelectual (1Tm
6.20-21). Com mais freqüência, há os que foram levados pela cobiça, como
Judas, Balaão e Demas, que amou o presente mundo. A demora, a
relutância, a indolência e a negligência em romper definitivamente com o
pecado e o erro são causas prováveis de apostasia, conforme o autor de
Hebreus ensina em toda a sua carta. Ele avisa que a dureza de coração e a
incredulidade são capazes de afastar alguém do Deus vivo (Hb 3.12-13).
Em resumo, os motivos externos são vários: amor ao dinheiro, orgulho,
problemas morais não resolvidos, vaidade intelectual, falta de coragem
para assumir a verdade e desejo de novidades. A raiz de tudo isso, ao
meu ver, é a falta de um coração regenerado, um motivo que os autores
bíblicos estão sempre prontos a admitir.
O apóstata pode
permanecer muitos anos na igreja e no ministério cristão sem jamais
revelar a apostasia que já aconteceu em seu coração. Outros, assumem a
apostasia e rompem abertamente com a fé cristã histórica, e geralmente
adotam outras doutrinas que mesmo aparecendo com cara de novas e
revestidas de respeitabilidade intelectual, nada mais são que as velhas
heresias teológicas e morais que a Igreja já enfrentou ao longo dos
anos. Eu não me espantaria se por detrás dos grandes desvios teológicos
da história encontrássemos pecados não resolvidos, orgulho, vaidade
intelectual, soberba, dureza de coração e – obviamente – corações não
regenerados. É claro que nunca saberemos ao certo. A história não
registra essas coisas que sempre são abafadas, escondidas e quase nunca
declaradas.
Até onde entendo, só há uma coisa que mantém o
cristão na verdade: o temor a Deus, a humildade e um coração
quebrantado. Os que verdadeiramente se humilham diante de Deus e tremem
de sua Palavra, mesmo que errem em pontos secundários, que caiam
eventualmente em pecados, jamais se afastarão definitivamente de Deus e
da sua palavra. O verdadeiro crente não pode mais abandonar a Deus. Nem
que queira. Nem que em momentos terríveis diga a Deus que nunca mais o
servirá. Ele acaba voltando. O apóstata vence essa barreira. Ele
consegue passar o limite. Ele consegue pular a cerca. Ele não receia o
que poderá acontecer. Pois no fundo ele realmente não acredita.
A
apostasia é uma realidade muito mais presente nos meios evangélicos
brasileiros do que se deseja perceber. O falso conceito de tolerância, o
relativismo, a falta de convicções doutrinárias, o liberalismo
teológico travestido de ciência, tudo isso favorece um quadro cinza e
enevoado onde os contornos do verdadeiro Cristianismo não são percebidos
com clareza. À noite, todos os gatos são pardos.
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