Cinco Votos para Obter Poder Espiritual.

Primeiro - Trate Seriamente com o Pecado. Segundo - Não Seja Dono de Coisa Alguma. Terceiro - Nunca se Defenda. Quarto - Nunca Passe Adiante Algo que Prejudique Alguém. Quinto - Nunca Aceite Qualquer Glória. A.W. Tozer

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

TIRE ESSE PESO DAS COSTAS

 


Por André Storck


Ultimamente tenho parado para observar quão difícil é ser um cristão em nossos dias. Não que isso seja uma novidade, pelo contrário, há muito tempo todo cristão que se preze sente na pele o peso advindo da natural repulsa que um viver de acordo com princípios bíblicos gera nas pessoas que se consideram independentes de Cristo.

Contudo, de uns tempos para cá a coisa tem piorado. Acontece que, como se não bastasse a perseguição por parte de uma sociedade avessa à ética cristã, o peso sobre os ombros dos fiéis tem sido aumentado pelos próprios líderes religiosos mal preparados e por falsos mestres.

As chamadas igrejas (ou seitas, como queiram) neopentecostais são as principais responsáveis por esse fenômeno, elas armam uma verdadeira equipe de guerra para cortar pela raiz qualquer iniciativa dos crentes no sentido de estudarem mais a fundo a Bíblia, o que os levaria -por definição - a se libertarem do julgo de superstições e mentiras. A tática do medo e da ameaça é a principal arma dos falsos profetas.

Os ensinamentos não bíblicos espalhados pregam mais ou menos o seguinte para os crentes mais simples que geralmente frequentam esses tipos de igrejas:

“Você deve obedecer tudo que o pastor mandar, você deve votar em quem o pastor mandar, você deve dar o dízimo e ofertas todo mês e você não pode beber álcool ou fumar.”

Esses mandamentos criados e impostos sobre as pessoas são logo seguidos da ameaça de medo e promessa de prosperidade:


“Se você fizer isso o diabo não poderá atacar a sua vida e você irá prosperar na saúde e financeiramente.”

É claro que as regras impostas não são de todo ruins. Isso porque existem pastores que são verdadeiros servos de Deus e buscam apascentar as ovelhas com amor e zelo. Há pastores honestos que não colocam o dinheiro em primeiro lugar, ao contrário, querem cuidar dos fiéis e honrar a Deus. Pastores que disciplinam de acordo com a Palavra as ovelhas que se desviam, sejam elas grandes dizimistas ou desempregadas. A esses homens devemos respeito e reverência.

O princípio bíblico do dízimo também é algo que - de fato - subsiste até os dias de hoje. Cada crente tem o dever de colaborar de bom grado para a manutenção da igreja. Como afirmou o apóstolo Paulo, cada um deve dar de acordo com o que proposto no coração, não por tristeza nem por necessidade, mas porque Deus ama a quem dá com alegria.

E, por fim, os malefícios do fumo em qualquer quantidade e também da ingestão de álcool de forma desregrada são conhecidos de todos. Ensinar a evitá-los ajuda tanto a saúde física quanto financeira dos fiéis.

Então o leitor deve estar se perguntando, onde está o erro? Onde está o peso extra colocado nas costas do povo de Deus?

O erro acontece, na chantagem e na contraproposta oferecida. Acontece quando a igreja começa a acrescentar deveres não prescritos na Bíblia e impô-los aos crentes de maneira muito parecida como fez e ainda faz a Igreja Católica. Acontece ainda quando fazem promessas não bíblicas que não se concretizam,  gerando decepção e levando os mais fracos a cair. Pecam ao colocar sobre as costas das pobres e exploradas ovelhas um peso que Jesus nunca recomendou.

Vejo com tristeza, por exemplo, o ensinamento não bíblico da ideia de “brechas”, segundo a qual o crente teria “poder” de dar autoridade para que o diabo atuasse sobre sua vida. Ora bolas, Deus não abriu mão de sua soberania. Pelo contrário, ele sabia que mesmo após a conversão nós ainda continuaríamos sujeitos a cair em tentação e pecar e, por isso, disse: “a minha Paz vos dou”. Ora a paz que Cristo dá é a certeza da salvação e de sua soberania “Todo o poder me foi dado”. É por isso que a paz de Jesus não é como a paz que o mundo dá, pois a paz do mundo só existe enquanto você seguir certinho todas as regras do mundo (e olhe lá). Por outro lado, a paz de Cristo permanece mesmo depois que você caiu e pecou, porque Ele sabe que isso acontecerá enquanto não formos para o céu. Cristo não perde o controle sobre sua vida depois que você peca. Daí que ele não nos deu a paz como o mundo a dá, ou seja, de forma condicionada. Ele disse em seguida “não se turbe o vosso coração, nem se atemorize”. Você só precisa se arrepender, confessar e voltar a Cristo depois de ter caído.

Mas muitas igrejas usam a tática do medo para manter os irmãos mais simples presos ali, dando o dízimo todo mês e votos nas eleições de dois em dois anos. Dizem: “Se você sair ou mudar de igreja, se você não votar em quem o pastor mandar, se você não der o dízimo dará “legalidade” ou abrirá “brecha” para o diabo entrar em sua vida e acabar com você e sua família”.

São vários os exemplos de ensinamento não bíblicos usados nessa tática do medo: “maldições adquiridas”, “caça a demônios territoriais”, “maldições hereditárias”, “mensagens subliminares” etc.
           
Os crentes que poderiam estar estudando a Bíblia, dando respostas sábias ao mundo, evangelizando, influenciando as artes, as músicas, influenciando no trabalho, nas escolas, na mídia e em muitos outros lugares ficam alienados vivendo com um terrível peso nas costas, um peso de medo e superstição. Vivem por aí "amarrando" demônios de imagens, pessoas e objetos, vivem procurando algum objeto “consagrado” em sua casa que pode estar dando “legalidade” ao inimigo. Veem demônios em tudo ao invés de reconhecer os próprios erros. Vivem correndo e tapando os ouvidos ao ouvirem músicas feitas por não crentes, vivem correndo de festas e confraternizações que tenham álcool, enquanto Jesus fazia o contrário.

Já vi cristãos que deixam de evangelizar porque acham que primeiro tem que “amarrar o demônio que está tapando o ouvido da pessoa”.

Irmãos que tarefas e pesos são esses que Cristo nunca colocou sobre nós? Que coisas são essas que alguns dizem que temos que fazer sem mostrar a base bíblica para tal? Que regrinhas são essas que nem Cristo, nem os profetas e nem os apóstolos seguiram?

Ide e pregai o evangelho, batizai e ensinai. O Espírito Santo se encarrega de convencer o coração e os anjos são os que lutam as batalhas espirituais.

Deus tem levantado em todo o Brasil milhares e milhares de cristãos que em contato com os estudos bíblicos da reforma protestante têm buscado novamente a pureza da igreja, uma igreja que viva somente de acordo com o que a Bíblia diz.  Esses verdadeiros profetas por certo serão perseguidos e terão um peso extra da discriminação dentro da própria igreja, pois o verdadeiro Evangelho liberta e tal libertação não diz respeito só à alma, mas mexe também com a própria estrutura de poder criada por muitos líderes que são voltados para o seu próprio umbigo e precisam do falso evangelho para manter o estipêndio ($).

Mas é nesse contexto que escrevo a todo irmãozinho e irmãzinha em Cristo, para que entreguem esse peso que falsos mestres colocaram sobre suas costas para Jesus, descansem na Paz que só o Senhor pode dar, confira tudo o que te dizem com o que está escrito na Bíblia e meditem nos singelos versos do nosso Mestre:

Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomais sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve. MATEUS 11:28-30.

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quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Corazim, Betsaida e o Molinismo

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Considere este post como uma (longa) nota ao meu post anteriorUM DOS TEXTOS PREFERIDOS DOS MOLINISTAS É MATEUS11:21-24, porque o mesmo indica (1) que existem contrafactuais verdadeiros de liberdade, isto é, verdades sobre o que as criaturas livres teriam feito em diferentes circunstâncias, e (2) que Deus sabe destes contrafactuais. No post anterior eu apontei que, apesar de (1) e (2) apoiarem o Molinismo quando confrontado com pontos de vista como o Teísmo Aberto, eles não o favorecem se comparado ao Agostinianismo, já que o mesmo também afirma (1) e (2). (O ponto onde o Molinismo e Agostinianismo divergem, pelo menos, filosoficamente, está no que diz respeito à natureza da liberdade da criatura e como o conhecimento de Deus sobre os contrafactuais da liberdade se relacionam com seu decreto eterno.)

Neste post eu quero destacar um comentário feito por Dan como incentivo a um exame mais detalhado de Mateus 11:21-24 e sua relevância para o debate entre molinistas e agostinianos. Dan escreveu:

Um dos clássicos “textos de prova” em favor do conhecimento médio também parece resistente a uma leitura agostiniana/calvinista e parece favorecer a liberdade não-determinista. Mateus 11:21 diz: “Ai de ti, Corazim! ai de ti, Betsaida! porque, se em Tiro e em Sidom fossem feitos os prodígios que em vós se fizeram, há muito que se teriam arrependido, com saco e com cinza”.
No calvinismo, a graça irresistível (também conhecida como “regeneração monergista” ou “chamado eficaz”) determina a conversão de tal forma que qualquer pessoa, dada a graça irresistível de Deus, não pode resistir e irá eventualmente se arrepender. Além disso, sem a graça irresistível, ninguém pode se converter devido a sua depravação.
Por esse versículo, sabemos que o povo de Corazim não se arrependeu, mas o povo de Tiro teria se arrependido se as mesmas obras tivessem sido feitas lá. Tiro era notoriamente pecaminosa, então a comparação tem como propósito envergonhar as pessoas de Corazim. Eles realmente tiveram uma grande oportunidade de se arrepender, logo, sua escolha de permanecer no pecado foi mais perversa do que a de Tiro. No entanto, no Calvinismo, Deus não deu ao povo de Corazin a única coisa que Ele sabia que poderia ativar e causar o arrependimento: a graça irresistível. Isso por si só é problemático!
Mas há um outro problema que diz respeito ao povo de Tiro. Nem as pessoas de Corazim nem as de Tiro se arrependeram. No calvinismo, poderíamos concluir com segurança que nenhum deles recebeu a graça irresistível, porque se tivessem recebido, eles se arrependeriam. Mas o versículo nos dá o contra-factual: o povo de Tiro teria se arrependido, se as mesmas obras fossem ali realizadas. Então, como é que Tiro poderia se arrepender sem a graça irresistível? No calvinismo, ficamos com a contradição de que a graça irresistível tanto é quanto não é uma condição necessária para o arrependimento.
Para evitar o problema, alguns podem dizer que o arrependimento não é verdadeiro arrependimento. Mas Cristo pregou sobre o verdadeiro arrependimento: arrependam-se pois o Reino de Deus está próximo! Ele nunca usa “arrependimento” como falso arrependimento e Ele sempre denuncia qualquer pretensão exterior de conversão e expõe qualquer auto-engano e falsa segurança. Além do mais, isso invalida (provavelmente inverte) o principal objetivo de Cristo de dizer as pessoas de Corazim que elas eram piores do que as de Tiro. É melhor recusar a ceia do Senhor do que participar de forma fingida, é melhor não saber o caminho da justiça do que conhecê-lo e sair dele, logo, é melhor viver em pecado aberto do que viver com um falso arrependimento. Portanto, se o arrependimento é um falso arrependimento, o povo de Corazim é melhor do que o de Tiro, porque eles evitaram um falso arrependimento. Mas isso é o oposto do que Cristo quer dizer.
A melhor solução parece ser negar a graça irresistível e dizer que o homem tem liberdade não-determinista em relação a resistir a graça de Deus.

Estas observações são certamente interessantes e merecem uma resposta. Mas, antes de entrar em detalhes, vamos considerar os detalhes do contexto em seus próprios termos:

Então começou ele a lançar em rosto às cidades onde se operou a maior parte dos seus prodígios o não se haverem arrependido, dizendo: Ai de ti, Corazim! ai de ti, Betsaida! porque, se em Tiro e em Sidom fossem feitos os prodígios que em vós se fizeram, há muito que se teriam arrependido, com saco e com cinza. Por isso eu vos digo que haverá menos rigor para Tiro e Sidom, no dia do juízo, do que para vós. E tu, Cafarnaum, que te ergues até ao céu, serás abatida até ao inferno; porque, se em Sodoma tivessem sido feitos os prodígios que em ti se operaram, teria ela permanecido até hoje.Eu vos digo, porém, que haverá menos rigor para os de Sodoma, no dia do juízo, do que para ti. (Mateus 11:20-24)

O texto nos diz explicitamente que o propósito de Jesus ao dizer estas palavras era “denunciar as cidades”, porque elas não se arrependeriam apesar de ter testemunhado muitos dos milagres que Jesus havia realizado. Eles tinham provas suficientes, mas recusaram reconhecer a autoridade de Jesus e desprezaram seu convite ao arrependimento. De forma mais específica, a denúncia de Jesus se dá com uma comparação com as antigas cidades notoriamente depravadas de Tiro, Sidom, e Sodoma.

Agora, será que essas declarações de Jesus apoiam as afirmações molinistas da forma que Dan nos está sugerindo? Em primeiro lugar, não é óbvio que devamos supor que Jesus esteja fazendo a afirmação contrafactual precisa que os molinistas assumem. Certamente Jesus está fazendo declarações assertivas aqui. Mas será que ele está realmente afirmando algo tão específico como uma verdade contrafactual literal sobre o que as pessoas dessas cidades antigas teriam feito se Jesus tivesse realizado os mesmos milagres diante deles? (Devemos notar, de passagem, que esse teria sido um possível mundo muito diferente deste!)

A questão que Jesus trata aqui é simplesmente que o povo de Corazim e Betsaida tinha um coração endurecido e que eles eram merecedores do Juízo por sua incapacidade de se arrepender; na verdade, eles foram ainda mais teimosos e culpáveis do que o povo de Tiro e Sidom. Esse ponto não implica por si só a precisa reivindicação contrafactual que Dan e outros molinistas assumem. A título de comparação, suponha que eu fosse repreender um dos meus filhos, dizendo: “Se eu lhe pedisse isso mil vezes, ainda assim você não faria o que lhe foi dito!”. Em face disso, essa afirmação tem a forma de um contrafactual de liberdade (se S estava na condição C, S faria/não faria A). Mas será que eu estou mesmo afirmando a proposição específica de que meu filho não faria o que eu havia pedido se ele realmente se encontrasse em circunstâncias em que eu lhe havia dito isso mil vezes (literalmente!)? Sugerir isso seria claramente interpretar excessivamente minhas palavras. Colocando em termos técnicos: essa interpretação acabaria perdendo o verdadeiro conteúdo proposicional da minha fala.

Naturalmente, o fato de que minha declaração não tinha o propósito de ser tomada de forma literal não significa que a proposição contrafactual seja falsa. A questão aqui é o significado da minha declaração (ou seja, qual proposição está expressando) ao invés de sua veracidade (ou seja, se a proposição expressa é realmente verdadeira). Ao fazer essa declaração, estou basicamente afirmando algo sobre a teimosia do meu filho. E o que estou afirmando é verdadeiro!

Da mesma forma, ao questionar se Jesus está realmente afirmando a proposição contrafactual que Dan assume que ele esteja, eu, enfativamente, não estou sugerindo que Jesus poderia afirmar algo falso. Ao contrário, estou sugerindo que a verdade que Ele está afirmando é muito mais simples: as pessoas de Corazim e Betsaida são teimosas e duras de coração (até mais do que o povo de Tiro e Sidon) e elas serão julgadas por isso. E essa verdade é tão consistente com a perspectiva agostiniana quanto com a perspectiva molinista.

A lição então é que os molinistas provavelmente colocam mais peso sobre este texto do que ele realmente contém. Quando prestamos atenção ao argumento que Jesus está fazendo, podemos ver que suas palavras não contém o tipo de vinculações filosóficas que apoiariam as reivindicações molinistas acerca dos contrafactuais de liberdade. Adaptando uma fala de Ludwig Wittgenstein: Os molinistas estão fazendo a “linguagem comum” de Jesus sair em férias.

Mas vamos supor que eu esteja errado sobre tudo isso. Vamos supor que Jesus realmente esteja afirmando proposições contrafactuais que Dan e outros molinistas acham que Ele esteja. Será que isso iria favorecer o Molinismo sobre o Agostinianismo, sabendo que este último rejeita a liberdade não-determinista e afirma a graça irresistível?

Uma questão importante diz respeito ao tipo de arrependimento tratado no versículo 21. Dan afirma que este deve ser “o verdadeiro arrependimento” ao invés de um “falso arrependimento”. Mas eu estou em dúvida sobre essa dicotomia simples. Parece-me que a Bíblia deixa espaço para um tipo de arrependimento que é genuíno até certo ponto (ou seja, não é totalmente sincero, não também não é um mero teatro) e ainda assim é não-salvífico (ou seja, fica aquém da verdadeira conversão espiritual). O arrependimento dos ninivitas no livro de Jonas pode muito bem ser um exemplo de tal arrependimento.

Se um arrependimento não-salvífico e limitado desse tipo está em vista no versículo 12, as questões que Dan levanta sobre a Depravação Total e a Graça Irresistível estão além da discussão. E isso não iria mudar em nada a denúncia que Cristo faz. Jesus, na realidade, estaria dizendo algo como: “Se os meus milagres tivessem sido feitos em Tiro e Sidom, eles teriam se arrependido [isto é, com um limitado arrependimento não-salvífico], mas vocês têm visto os milagres e não responderam a eles com nenhum tipo de arrependimento! “Tal leitura seria inteiramente consistente com a observação (correta) de Dan de que “o principal objetivo de Cristo era dizer que as pessoas de Corazim eram piores do que as de Tiro”.

Mas mais uma vez, vamos assumir a suposição de Dan para o bem do argumento, ou seja, vamos assumir que o arrependimento no versículo 21 deve ser arrependimento totalmente salvífico. Isso iria levantar um problema para o Agostinianismo/Calvinismo? Eu não penso assim, e vou explicar por que, em resposta ao argumento de Dan.

Dan observa que, na visão calvinista, nem o povo de Tiro nem o de Sidom, nem as pessoas de Corazim ou Betsaida haviam recebido a Graça Irresistível, porque se eles tivessem, teriam se arrependido. Isso é verdade: decorre da própria definição de Graça Irresistível. (Eu prefiro falar de “graça eficaz”, mas não vamos tergiversar sobre rótulos.) Dan assume ainda mais, no entanto, que, no cenário contrafactual em que Tiro e Sidom se arrependeriam em resposta às grandes obras, eles não haviam recebido a Graça Irresistível. Assim, ele conclui que o versículo 21 não se ajusta com aquilo que o calvinista alega (que ninguém pode se arrepender sem graça irresistível).

Mas esta suposição é injustificada. Na interpretação padrão de contrafactuais, precisamos considerar se o efeito do contrafactual (de Tiro e Sidom se arrependerem) é verdade no mais próximo mundo possível em que o fator antecedente (i.e., o povo de Tiro e Sidon ver as grandes obras) é verdade. Por tudo o que sabemos, o mais próximo mundo possível é aquele em que o povo de Tiro e Sidom recebem a Graça Irresistível. Certamente, Dan não nos deu nenhuma boa razão para excluir esta possibilidade. Tendo em conta que em uma visão compatibilista da liberdade, as livres escolhas de uma pessoa são determinadas não só por fatores internos a essa pessoa, mas também por fatores externos (ou seja, circunstâncias), e que podem haver relações causais complexas entre esses fatores internos e externos, seria difícil de refutar esta suposição. Deus trabalha fora seu decreto através de uma multiplicidade de meios inter-relacionados. Por que o mundo mais próximo possível em que Deus decreta que os milagres de Cristo seriam realizados em Tiro e Sidom não poderiam também ser um mundo onde Deus leva Tiro e Sidom ao arrependimento através de sua Graça Irresistível?

Com efeito, para levar a discussão um pouco mais adiante, por que os milagres não podem fazer parte dessa graça irresistível? (Créditos a Paul Manata por sugerir essa idéia). No coração da doutrina da graça irresistível está simplesmente a afirmação de que Deus tem poder para trazer qualquer pecador  espiritualmente morto que Ele escolhe para a salvação, de tal forma que eles vêm a Cristo livremente (ou seja, sem coerção; veja WCF 10.1). Mas Deus é livre para usar uma ampla variedade de meios (incluindo meios circunstanciais) para cumprir o seu chamado eficaz em diferentes pessoas, como a diversidade de testemunhos de conversão cristã ressalta. Não devemos pensar na Graça Irresistível como uma espécie de interruptor espiritual interno que Deus simplesmente pressiona a fim de levar alguém a conversão! Haverá sempre alguns meios que são centrais e universais entre as conversões genuínas, tais como a obra interna do Espírito Santo ao trazer convicção do pecado e a compreensão do evangelho. Mas os meios circunstanciais pelo qual Deus leva a fé e o arrependimento podem e, de fato, variam consideravelmente.

Tendo dito tudo isso, dentro de uma visão reformada da providência divina e do chamado eficaz, os pressupostos de Dan sobre o cenário contrafactual em que os povos de Tiro e Sidom se arrependeriam são injustificados. E, portanto, mesmo se admitirmos suas outras hipóteses (isto é, que Jesus está fazendo uma reivindicação contrafactual literal e precisa e que o arrependimento no versículo 21 deve ser um arrependimento salvífico), os pronunciamentos de Cristo em Mateus 11:21-24 não dão nenhum apoio adicional ao Molinismo se deparado contra o Agostinianismo/Calvinismo. Uma perspectiva calvinista e compatibilista pode acomodar estas declarações de Cristo tão bem como uma perspectiva molinista e libertária.

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Autor: James N. Anderson
Fonte: Analogical Thoughts 
Tradução: Erving Ximendes

Via: Bereianos 


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9 marcas de uma igreja doente

 

 Graças ao Mark Dever, muitos de nós passamos a conhecer bem as Nove Marcas de uma Igreja SaudávelEmbora elas nunca tenham tido a pretensão de ser a última palavra em tudo o que uma igreja deva ser ou fazer, as nove marcas têm sido úteis para lembrar os cristãos (e pastores em especial) de elementos necessários que sempre esquecemos em uma era concentrada no estilo.
 Em certo sentido, as nove marcas de uma igreja doente poderiam ser simplesmente o oposto de tudo aquilo que compõe uma igreja saudável, de maneira que uma igreja doente ignora a membresia, a disciplina, a pregação expositiva e todo o resto. Mas os sinais de doença na igreja nem sempre são tão óbvios. É possível que a sua igreja ensine e entenda todas as coisas certas e, ainda assim, seja um lugar terrivelmente doente. Sem dúvida há dezenas de indicadores que uma igreja se tornou disfuncional e enferma, mas limitemo-nos à nove.
Aqui vão nove marcas de que a sua igreja — mesmo uma que creia na Bíblia, pregue o evangelho e abrace uma boa eclesiologia — possa estar doente.

1) Quanto mais periférico o tópico do sermão, mais entusiasmadas as pessoas ficam. Uma das coisas que sempre adorei na nossa igreja é que os sermões que as pessoas mais amam são aqueles que lidam com os temas mais centrais da Bíblia. Elas amam ouvir a respeito do pecado e da salvação, sobre a glória de Deus, sobre a providência, sobre Cristo e a cruz. Não é que eles nunca ouçam (ou tenham aversão a) sermões sobre o fim dos tempos ou questões sociais ou mordomia financeira ou casamento ou paternidade e maternidade, mas elas parecem mais apaixonadas pelas mensagens que se concentram mais em culpa, graça e gratidão. Eu fico preocupado quando uma congregação se cansa de ouvir sobre a Trindade, a expiação, o novo nascimento ou a ressurreição e quer ouvir outra longa série sobre como lidar com o estresse ou as 70 semanas em Daniel.

2) Os funcionários da igreja não tem prazer em trabalhar. Todo trabalho tem seus altos e baixos. Todo ofício terá tensão de vez em quando. Mas a liderança deve observar quando os funcionários parecem mal-humorados, infelizes e têm que se arrastar para a igreja a cada dia. Os funcionários da sua igreja desfrutam da presença uns dos outros? Eles conversam entre si como amigos no salão da comunhão? Você os vê rindo juntos? Se não, pode haver estresse em andamento, ou conflito, ou algo pior.

3) O pastor e a sua esposa não se dão bem. Não estou falando das desavenças corriqueiras e dos períodos difíceis pelos quais todo casal passa. Estou falando de um casamento que esfriou e perdeu o amor, um relacionamento superficial e carente de paixão. Toda igreja deveria ter algum mecanismo preparado para perguntar ao pastor e à sua esposa como vai (ou não) o casamento. Igrejas podem sobreviver a muitos conflitos, mas raramente serão lugares felizes e saudáveis se o pastor e a sua esposa estão secreta ou abertamente infelizes e doentes.

4) Quase ninguém sabe para onde vai o dinheiro. Igrejas lidam com suas finanças de diferentes maneiras. Conforme as igrejas crescem, pode ser mais difícil (ou até insensato) que todos tenham voz na alocação de cada centavo. Ainda assim, quando se trata de finanças, exagerar para o lado da transparência raramente é uma má ideia. No mínimo, deve haver mais do que um pequeno grupo de pessoas que saiba (e tenha voz sobre) para onde vai o dinheiro. Não faça do salário do pastor uma questão de segurança nacional.

5) A equipe de liderança nunca muda ou sempre muda. Ambas as situações são sinais alarmantes. Por um lado, a igreja fica com um olhar muito limitado para si mesma quando nunca há sangue novo entre os líderes. Se os seus presbíteros, diáconos, líderes de comissão, líderes de pequenos grupos, professores de EBD, coordenadores e membros do grupo de louvor são os mesmos agora desde quando José Sarney foi Presidente da República, você tem um problema. Talvez os antigos líderes gostem do poder, talvez ninguém mais esteja sendo treinado, talvez sua igreja não tenha recebido ninguém novo em vinte anos. Todos esses são grandes problemas. Por outro lado, se os presbíteros nunca estão interessados em servir mais um termo e os funcionários nunca ficam por mais do que dois anos, a cultura da sua igreja pode ser muito confinada, muito cheia de conflito ou muito impiedosa para com erros honestos.

6) Ninguém jamais é levantado da igreja para o ministério pastoral ou é enviado da igreja ao serviço missionário. Boa pregação inspira homens jovens a pregar. Clareza sobre o evangelho empolga homens e mulheres a compartilhar o evangelho com aqueles que não o ouviram. Igrejas menores podem não enviar obreiros todo ano, mas a congregação que quase nunca produz pastores e missionários quase nunca é uma igreja saudável.

7) Existe uma lentidão exacerbada na tomada de decisões. Isso pode ser culpa da congregação. Alguns membros insistem em aprovar cada decisão, desde contratação de funcionários, a duração do culto e a cor do carpete. Se todos têm que votar em cada decisão, a sua igreja nunca será maior que o número de pessoas informadas que podem votar em cada decisão (que é um número bem pequeno). Essa lentidão pode ser culpa do pastor. Em algumas igrejas nada acontece sem a aprovação pessoal do pastor e sua direta supervisão — uma receita certeira para guerras territoriais, crescimento atrofiado, e afastamento de líderes talentosos.

8) A pregação se torna errática. Isso pode ter muitas formas. Talvez o pastor não compartilhe mais o púlpito com outros membros e o ocasional convidado de fora. Talvez o oposto esteja acontecendo, e o pastor pareça estar chamando substitutos mais frequentemente do que o contrário. Talvez a pregação tenha se tornado mais virulenta, ou sempre martele no mesmo tema, ou mostre sinais de pouca preparação. Talvez você tenha notado que o pregador está contando mais com vídeos ou esboços que não são de sua autoria, ou constantemente reutiliza material de poucos anos atrás. Ninguém quer que a pregação seja enfadonha. Alguma variação deve ser esperada e bem vinda. Mas preste atenção se o pregador parece doutrinariamente instável, irritável ou exausto.


9) Há problemas que todos conhecem, mas ninguém conversa abertamente a respeito. Igrejas doentes muitas vezes têm uma grande regra tácita: a pessoa que menciona os nossos problemas é que tem problema. Pode ser um pastor que não sabe pregar, um organista que nunca fica para ouvir o sermão, um presbítero que dizem que está em um relacionamento ilícito, um diretor de juventude que não tem jeito para falar com crianças, um funcionário que não se dá com ninguém, um líder que que lidera por ordens e intimidação. O melhor é que muitos problemas sejam tratados em secreto e discretamente, mas isso não é desculpa para fazer vista grossa para o que todos podem ver claramente. Falar sobre aquilo que todos conhecem é, muitas vezes, o primeiro passo para tirar do problema o seu poder incapacitante.

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Via : Voltemos ao Evangelho 

Por: Kevin DeYoung. © 2015 The Gospel Coalition. Original: 9 Marks of an Unhealthy Church. Tradução: Alan Cristie. Revisão: Vinícius Musselman Pimentel. © 2014 Ministério Fiel. Todos os direitos reservados.  Website: MinisterioFiel.com.br. Original: 9 marcas de uma igreja doente.



terça-feira, 24 de novembro de 2015

Introdução crítica ao Molinismo - parte 1

 

Introdução crítica ao Molinismo - parte 1
















Introdução


Molinismo é o nome dado ao sistema de teologia e filosofia do jesuíta espanhol Luis de Molina (1535 – 1600) que procura reconciliar ou solucionar o problema da presciência de Deus e da liberdade humana. 

Nas últimas décadas com o advento da filosofia analítica da religião, antigos temas que haviam sido deixados de lado após o ataque do positivismo lógico, voltam aos estudos com mais vigor pela mesma utilização da análise linguística. 
Entre esses temas, o antigo dilema da presciência divina e da liberdade humana encontra-se redivivo pelas mãos do filósofo cristão Alvin Plantinga (1932 –). Depois de pouco mais de quatrocentos anos, o debate em torno do problema do mal e livre-arbítrio ressurgiu nas páginas de seu livro The Nature of Necessity(Clarendon Press, Oxford, 1974). No ano anterior, no Concílio para Estudos Filosóficos do Instituto Summer em Filosofia da Religião, Plantinga apresentou uma versão da Defesa do Livre-Arbítrio sobre o Problema do Mal.1 Naquela ocasião, Plantinga apresentou sua versão baseando-se na premissa da existência de contrafactuais de liberdade2 e que a onisciência de Deus inclui o conhecer os valores de verdade3 desses contrafactuais.

Plantinga reconhece que, ao apresentar sua palestra, fora advertido por Anthony Kenny que ele era um “Molinista”, ao que Plantinga respondeu: “Eu não estava certo se aquilo era uma aprovação ou condenação.”4   

Até então, o Molinismo, a despeito de sua sofisticação filosófica ou teológica, estava, para usar as palavras de Ken Perszyk,5  

relegado a um canto escuro e empoeirado de um museu na história da teologia filosófica, não fosse a ‘reinvenção’ de Plantinga no curso de seu desenvolvimento da Defesa do Livre-Arbítrio contra o Argumento Lógico do [problema do] Mal na década de 1970.

É importante recolocar essa história porque Plantinga é considerado “o principal filósofo de Deus”,6  responsável pelo reavivamento da filosofia cristã nos últimos quarenta anos. 

Embora criado na tradição reformada holandesa – no Calvinismo histórico – Plantinga, aos oito ou nove anos de idade, começou “a entender e pensar seriamente sobre o assim chamado Cinco Pontos do Calvinismo”, o que o levou a pensar, especificamente a partir da doutrina da Depravação Total, “que todo mundo era completamente ímpio, completamente mau, não melhor que Hitler ou Judas” e isso parecia-lhe confuso e difícil de acreditar.7 Aliado a isso, um dos principais interesses de Plantinga que, como ele diz, o “tem me perturbado e tem sido fonte de genuína perplexidade” é a “existência de certos tipos de mal” e isso continuou “profundamente desconcertante” mantendo seu foco mesmo quando mudara para Notre Dame em 1982, depois de quase vinte anos ensinando no Calvin College.8 

É nesse contexto de perplexidade que devemos entender o ressurgimento do Molinismo e isso da parte de um cristão criado na tradição reformada, e também uma vez que Plantinga entende que o problema do mal, talvez “constitua a objeção mais formidável às crenças teístas”.9 

O objetivo do presente artigo é apresentar os contornos críticos do Molinismo. Embora seja primariamente histórico, não será menos crítico em avaliar alguns aspectos do Molinismo, especialmente aquele relacionado ao Conhecimento de Deus. Esperamos, para em breve, novos artigos, aprofundando as críticas das perspectivas teológicas, exegéticas e filosóficas ao Molinismo.

Se eu estiver certo em minhas pesquisas, o Molinismo não é uma opção protestante, nem para Calvinistas, nem para Arminianos, e com sérias inconsistências internas.
    

EXPOSIÇÃO DA CARTA AOS EFÉSIOS - Pr. Antonio Carlos Costa

 





segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Fatores que evidenciam uma Crise Pastoral

 
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Em dias de crise econômica e escassez ética, nada melhor que refletir sobre as motivações que podem gerar uma situação igual a que estamos vivendo no contexto político de nossa pátria. Refletir sobre o tema específico é proveitoso. É justamente isso que iremos fazer neste conteúdo. Porém, não direcionaremos nossa reflexão à crise político-econômica de nossos dias. Pois, ao abordar esse tema, necessariamente, outros temas viriam à baila. E se fizermos uma busca pelo ponto cerne de tudo, sem sombra de dúvidas, chegaríamos ao pecado como causa. Mas, a crise a ser abordada aqui, bem como suas causas, é na realidade outra, e que tem se instaurado em outro ambiente, a saber, no ministério pastoral. 

Há anos que temos instaurado no cenário religioso tupiniquim uma verdadeira “crise pastoral”. Em primeiro lugar, precisamos definir termos; Poimen, este que é o termo utilizado para pastor em grego e que significa supervisionar o rebanho – cuidado contínuo, zelo, preocupação com bem-estar e saúde das ovelhas. Observando o significado do termo em si, logo nos vem algumas dúvidas, a saber: Por que tantas pessoas que se aventuram no ministério pastoral não possuem essas características? Por que tantos que se aventuram neste ofício realizam a lógica contrária, a saber, obter vantagens próprias por meio das “ovelhas” ao invés de ampará-las? Na realidade, vivemos uma grande “Crise Pastoral” sem precedentes. Neste texto, tentarei destacar alguns dos principais motivos de tal crise.

O primeiro e mais grave motivo pelo qual vivemos em dias atuais, uma verdadeira “Crise Pastoral” é a falta de conhecimento bíblico que norteia o cenário religioso cristão da atualidade. O profeta Oseias já alertava no seu tempo (Oseias 4:6). Na atualidade há uma baixa cultura literária em nossa nação, e dentro deste índice, A Bíblia figura. O problema aumenta quando entendemos que todo e qualquer cristão deva ter o mínimo de conhecimento dos idiomas originais da Bíblia, isso porque vivemos uma época onde cada vez mais pessoas combatem os pressupostos cristãos se utilizando da própria Bíblia e de recursos exegéticos (na grande maioria das vezes fazem “eixegese” ao invés de exegese) – um bom exemplo é a Teologia Inclusiva que tenta usar argumentos bíblicos para legitimar-se. Quando se figura num cenário, cristãos que leem e conhecem pouco o livro que regulamente suas regras de fé e prática – A Bíblia – e pessoas que a estudam com intenções tendenciosas e ideológicas, sempre com intuito de refutá-la, temos um ambiente favorável para o surgimento de várias aberrações da fé. Este é o pano de fundo da “Crise Pastoral” que anunciamos aqui. Vejamos as palavras do profeta Oseias:
O meu povo foi destruído, porque lhe faltou o conhecimento; porque tu rejeitaste o conhecimento, também eu te rejeitarei, para que não sejas sacerdote diante de mim; e, visto que te esqueceste da lei do teu Deus, também eu me esquecerei de teus filhos”. (Oseias 4:6)

O interessante é ver nisso tudo que o próprio Deus rejeita aqueles que rejeitam o conhecimento, Deus os rejeitou como sacerdotes. O conhecimento pode ser entendido aqui como a lei de Deus, e quem a rejeita, Deus os rejeita. Podemos perceber que há uma grande possibilidade de haver no cenário religioso atual uma quantidade elevada de pessoas que rejeitam e negligenciam à Bíblia, e, por isso, são rejeitados por Deus. Mas, estas pessoas, se intitulam pastores aptos a conduzir o rebanho. Estas pessoas estão lançadas às suas próprias sortes. Deus os rejeitou como sacerdotes, líderes e pastores, por negligência da Palavra de Deus. Imagine agora como será um ambiente onde o líder fora desprezado por Deus, mas ele se julga apto a liderar o rebanho? É justamente nesses ambientes onde vemos as maiores aberrações da fé. Assim como Israel caminhou em direção da destruição por ter negligenciado a Lei de Deus, muitos caminham em direção de um precipício e de olhos vendados, sendo guiados por um líder que também não enxerga nada. Falsos pastores conduzindo falsas ovelhas, pois as verdadeiras ovelhas reconhecem a voz de seu verdadeiro pastor (João 10). 

Outro motivo que poderia figurar na lista das causas da “Crise Pastoral” que vislumbramos em nossos dias, seria cometido por aquelas pessoas que escolhem ser pastor. Certo dia ouvi uma pessoa dizer que desde pequeno sonhava em ser pastor. Ela não queria realizar outra coisa em sua vida. Ao ouvirmos isso, aparentemente, soa como algo lindo. Porém, precisamos refletir biblicamente sobre esta alegação. Moisés foi um dos homens chamados por Deus que relutou contra isso (Êxodo 4:1-17), ele não se sentia preparado para executar tamanha tarefa, nem muito menos queria ser líder desde pequeno. O próprio Jeremias relutou quando Deus o chamou (Jeremias 1:6) como se não se avaliasse preparado. Inclusive, é o próprio profeta quem escreve em seu livro que os pastores serão dados exclusivamente por Deus (Jeremias 3:15). Jeremias também não sonhava em exercer uma liderança desde criança. Nestes dois casos, nenhum dos personagens bíblicos escolhe ser líder do povo, mas Deus os chama mesmo assim. Numa outra passagem das Escrituras Sagradas, outro dado interessante é quando o Profeta Samuel vai até a casa de Jessé escolher o novo rei de Israel em sucessão de Saul (I Samuel 16), Deus dá uma ordem ao profeta:

Porém o Senhor disse a Samuel: Não atentes para a sua aparência, nem para a grandeza da sua estatura, porque o tenho rejeitado; porque o Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração” (I Samuel 16:7)

Aqui vemos uma concatenação entre  os dois textos mencionados, a saber, o de I Samuel 16:7 e o de Jeremias 3:15. Mas, mais que isso, estas palavras foram ditas por Deus quando Samuel tinha olhado para um dos filhos de Jessé (Eliabe) e o havia avaliado como sendo o futuro rei de Israel. Mas Deus alerta Samuel para não se iludir com a aparência. Hoje sabemos que as aparências enganam. Deve ser por isso que só Deus pode conceder pastores, porque só Ele pode sondar os corações. E como o próprio homem não conhece de fato seu próprio coração e nem o coração alheio, é melhor que Deus confirme e escolha aqueles que devem conduzir o rebanho. 

Podemos mencionar também o apóstolo Paulo como sendo importante expoente dentro desta lista e tema, pois o mesmo fora chamado por Deus de uma forma bem específica. Sua conversão, sobrenatural, na estrada de Damasco, aponta para um homem que não escolhe Deus, mas que Deus o escolhe. Ao avaliarmos o processo que Deus executa em chamar aqueles que Ele mesmo escolhe para a realização de sua obra, não vemos nenhum homem que escolhe, desde pequeno, servir a Deus. Vemos homens que foram chamados, em determinados momentos de suas respectivas vidas, alguns ainda com pouca idade (o rei Josias que foi levantado por Deus aos oito anos de idade), outros já de idade adulta, mas independente disso, homens que nem se quer pensavam em desenvolver uma função dada por Deus. Com isso, devemos atentar para algo, a saber, precisa-se ter muito cuidado quando alguém abre a boca e diz que desde pequeno sonhava e queria ser pastor. Essas palavras podem ser verdadeiras, mas a Bíblia não dá ênfase a tal regra, muito pelo contrário, a grande maioria dos chamados de Deus em direção ao homem se dá quando este mesmo homem já possui uma idade adulta e nem se quer fazia planos para seguir a Deus. Talvez este seja um dos principais motivos cujo qual sofremos uma grande “Crise Pastoral” na atualidade – pessoas que escolhem ser pastor, e todo bom pastor não escolhe ser, mas Deus o escolhe. 

Outro motivo recairia na omissão e falta de coragem por parte de muitos homens em realizar tanto sua função pastoral, como também seu próprio papel de homem. Entendemos que antes de tudo, um bom pastor precisa ser “Homem” – com H maiúsculo. Vivemos uma “Crise Pastoral” porque muitos homens se esquecem disso. Quando me refiro ser homem, não me refiro aos aspectos masculinos, mas sim à personalidade e caráter. Refiro-me ao que de fato é masculinidade. E dentro deste conceito sabemos que existem dois tipos de masculinidade; a verdadeira e a falsificada. Nas palavras de Douglas Wilson, seria desta forma:
“A masculinidade falsificada se destaca por criar desculpas; porque essa ‘masculinidade’ é uma questão de orgulho, e não a humilde aceitação da responsabilidade. Assim, qualquer coisa que ameace esse orgulho deve ser rejeitada. Uma das coisas que sempre ameaçam o orgulho é qualquer tipo de falha, e a maneira como homens inseguros lidam com isso é dando desculpas. A verdadeira masculinidade assume a responsabilidade, e ponto final. Já a falsa masculinidade irá querer aceitar a responsabilidade apenas por aquilo que deu certo.” (WILSON, 2012, p. 24)

Um dos principais motivos por vivermos na atualidade uma “Crise Pastoral” é nada mais nada menos que ausência de uma masculinidade verdadeira e a presença de uma masculinidade falsificada nos homens envolvidos com a obra de Deus. Homens de masculinidade falsa, que não assumem suas responsabilidades pastorais. Assumir responsabilidades é a maior característica presente no caráter de um “Homem”, e é justamente esta característica que evidencia os homens de masculinidade verdadeira, àqueles com H maiúsculo. Como este tipo de homem está em extinção no cenário religioso do Brasil, figurando mais os homens de masculinidade falsificada, este segundo grupo de “homens” dão margem para surgir várias aberrações nos púlpitos. Infelizmente, muitas mulheres assumem a postura que devia ser vista nos homens. O surgimento do fenômeno da ordenação feminina no seio da liturgia cristã contemporânea, não se dá apenas por falta de conhecimento bíblico-exegético – mesmo entendendo que este é o principal motivo deste fenômeno –, mas também por termos na atualidade uma geração de homens de masculinidade falsificada que não assumem suas respectivas responsabilidades pastorais. Sempre que uma mulher é ordenada pastora, há por trás disso um homem de masculinidade falsificada. Sua masculinidade é tão falsificada que uma mulher assume seu lugar. É como se ela estivesse dizendo em alto e bom tom: “Aqui tem homem!”, e infelizmente, o papel do homem é realizado por ela mesma. Este é mais um dos principais motivos por estarmos vivendo na atualidade uma “Crise Pastoral”.

Por fim, entendemos que todo o processo do chamado de Deus em direção aos verdadeiros pastores e líderes atende uma ordem monérgica. Ou seja, é o próprio Deus quem a executa de forma plena e autônoma. Quando o homem se julga preparado para exercer tamanha função, já é um mau sinal. Pois, como o Próprio Deus é quem chama, Ele mesmo preparará o indivíduo gradativamente. E uma das características dos homens chamados e levantados por Deus é justamente nunca se sentir preparado. O preparo além de ser gradativo, não possui um estágio final, e é contínuo. É por nunca se sentir preparado que aqueles que Deus realmente levantou como pastores acreditam ser de tamanha responsabilidade este título – pastor. Por outro lado, há aqueles que se avaliam como sendo totalmente aptos e preparados a exercer as funções pastorais. Eles se avaliam como sendo tão aptos e preparados que não aceitam, nem sequer, serem chamados mais de pastores, pois este título rebaixa suas condições elevadas de homens preparados. O título de pastor provoca comichão e incômodo na alma, provoca inquietação e insatisfação – “paipóstolo”, “mãepóstola”, “apóstolo” etc., conforta mais uma alma megalomaníaca e sedenta por uma subida incessante na escadaria do poder. 

Daqui uns dias o título de demiurgo estará sendo utilizado por alguns destes homens. Deve ser justamente estes a quem Oseias nos alerta. Estes que rejeitaram o Senhor e que foram rejeitados e esquecidos de forma recíproca. Estes que caminham por caminhos que não conhecem e levam consigo uma grande multidão que juntos estabelecem em nossos dias uma profunda, funesta e amarga “Crise Pastoral”. 

Falsos pastores se estabelecem por si próprio, mas o verdadeiro pastor é Deus quem levanta, e as verdadeiras ovelhas, não as falsas, conhecem a sua voz.

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Autor: Thiago Azevedo
Via: Electus

Fonte: Bereianos


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