John Stott em seu comentário do livro de Efésios diz: “Ninguém pode emergir de uma leitura cuidadosa da carta de Paulo aos Efésios com um evangelho privatizado ou privado. Efésios é o evangelho da igreja. A carta estabelece o propósito eterno de Deus de criar através de Jesus Cristo um povo que se destaca em relevo brilhante contra o fundo sombrio do velho mundo”.
Eu vi com meu filho, Matheus, o filme Passageiros. Muitos críticos não gostaram... mas eu gostei, talvez por motivos diferentes que outras pessoas não estavam interessadas.
Se você tivesse sentado lá, vendo o filme só querendo analisá-lo como ficção científica, ou romance... talvez tenham razão de não vê-lo como um grande filme. Mas é uma característica essencial do ser humano, que fez o filme um bom filme.
Seu tema subjacente é que á única coisa sem a qual a humanidade não pode sobreviver, sem as necessidades básicas – comida, remédios, água.. é a nossa vital e profunda necessidade de relacionamento, de interação, de companhia um dos outros. De amar e ser amado.
No filme, uma nave está fazendo uma viagem que irá durar 120 anos até chegar a um planeta distante, onde colonos pretendem ter, como quando as pessoas vieram para a América há séculos, uma oportunidade de construir um novo tipo de vida.
A nave está levando 5.000 colonos mais os tripulantes que são colocados numa espécie de hibernação e animação suspensa, de tal forma que, quando chegaram ao destino 120 anos depois, tenham ainda a mesma idade de quando saíram da terra.
Mas trinta anos após o início da viagem, há uma pane elétrica que acorda um dos passageiros. Agora ele está condenado a viver o resto da vida sozinho. Na nave tem tudo para ele sobreviver... tanto uma vida altamente tecnológica, como alimento e conforto... Mas faltam 90 anos para a nave chegar e os outros acordarem. Agora ele está condenado a viver sozinho.
Ele gasta todo o primeiro ano tentando achar uma saída para a situação. Tenta se colocar de novo em hibernação. Ele tenta entrar em contado com a terra. Tenta acordar a tripulação pensando que eles talvez conheçam alternativas. Tudo falha. Todas as tentativas de corrigir a situação é inútil. Por fim, ele tem que gastar todo o tempo e esforço simplesmente tentando preservar sua sanidade.
Entenda, a nave é como um transatlântico de cruzeiro. Ela tem todo tido de diversão, conforto e alimento que um homem poderia desejar. A única coisa que falta é a interação humana e relacionamentos.
Em seu desespero final depois de anos, ele acaba decidindo despertar um dos outros colonos – é uma atitude egoísta – ele sabe que condenará a pessoa que for despertada a compartilhar seu destino de envelhecer ali e morrer antes da nave chegar ao seu destino mesmo que vivam décadas juntos. Mas ele se sente incapaz de não fazê-lo. Não despertar alguém. Nossa necessidade de relacionamento é simplesmente muito profunda para que possamos simplesmente suprimi-la.
Agora, o filme logo me fez pensar sobre a origem de uma necessidade tão profunda assim em cada homem. O que o filme quer mostrar, é que a única coisa que precisamos para sobreviver além do sustento para o corpo, é uma relação, este é um traça meramente humano ou um traço de Deus no homem?
É parte da imagem de Deus em que fomos criados, a “imago dei” em si mesmo? O apóstolo João diz com confiança que Deus é amor!
“E nós conhecemos, e cremos no amor que Deus nos tem. Deus é amor; e quem está em amor está em Deus, e Deus nele.” 1 João 4:16
“Aquele que não ama não conhece a Deus; porque Deus é amor.” 1 João 4:8
Não é dessa imagem que nossa necessidade de relacionamento flui? O Criador não existe “sozinho”, mas existe eternamente na unidade perfeita da Trindade. Por isso eternamente Ele é amor. E nos criou para estarmos numa relação assim com Ele, e com os outros. Jesus orou para que fizéssemos parte desse amor eterno: “E eu lhes fiz conhecer o teu nome, e lho farei conhecer mais, para que o amor com que me tens amado esteja neles, e eu neles esteja.” - João 17:26. Ele pede ao Pai não só para que o amemos, mas para que o amor eterno do Pai esteja em nós... Ele ora para que o amemos com o mesmo amor que o Pai lhe ama por toda a eternidade. Isso é incrível!
Jonathan Edwards ( 1703 – 1758 ) falando sobre a natureza do amor cristão diz:
“Todo amor cristão verdadeiro é único, e igual no que diz respeito a seus princípios. A despeito do seu objeto, grau, e modo de expressão, este amor jorra de uma mesma fonte. Por isso ele se distingue de outros tipos de amor que são inferiores, e que brotam de vários princípios, motivos, e pontos de vista.
É o Espírito Santo que influência o coração do Cristão nos diferentes aspectos desta virtude. O seu trabalho é um trabalho único, que nos leva a amar de forma imediata a Deus, e como consequência disso, aos homens. Além disso, cada faceta do amor Cristão brota de um único motivo, ou seja, o amor a Deus e a Sua excelência, beleza, e santidade.
Nós amamos os homens caídos porque foram feitos à imagem e semelhança de Deus. Nós amamos grandemente os remidos porque, a cada dia, eles se tornam mais semelhantes a Deus. O amor a Deus é o fundamento do amor gracioso demonstrado ao homem.
A razão nos ensina esta verdade. A verdadeira natureza do amor concede ao homem a direção apropriada para agir com todo respeito, tanto para com Deus, quanto para com os homens. Nenhum outro encorajamento se faz necessário. O amor nos incentivará a honrar, adorar, crer, e obedecer a Deus. O amor nos incentiva a agir como filhos diante do nosso Pai celestial. A alma que ama a Deus se deleita em ser humilhado, ao mesmo tempo em que Ele é exaltado. Quanto ao nosso próximo, o amor nos incentiva a todo comportamento nobre, como a honestidade, mansidão, ternura, e misericórdia. O amor nos afastará de toda inimizade, crueldade, e egocentrismo. O amor não faz mal ao próximo (Romanos 13: 10). O amor nos dá a disposição de cumprir todos os deveres ordenados por Deus em nossos relacionamentos neste mundo. Se o princípio do amor está implantado no coração, ele sozinho é capaz de produzir todas as boas ações, pois ele abrange cada virtude.
Por isso dizemos novamente: a razão nos ensina que sem o amor, todas as aparentes virtudes e realizações são imperfeitas e hipócritas. A obediência sem amor é fingida e vã. Aquele que não ama a Deus não irá respeitá-Lo, e muito menos confiar nEle. Sem o amor, toda boa conduta externa não passa de hipocrisia vazia.”
Essa desesperada necessidade de relacionamento humano que o filme Passageiros mostra, é um eco dessa necessidade essencial com a qual nossa alma foi criada e que encontrará realização na perfeita comunhão com Deus em Cristo e os redimidos para sempre. Jesus ora pelos eleitos: “Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo.” João 17:24 – “Estejam ( plural ) para que vejam ( plural ) a minha glória; porque tu me amaste!”
Vê o que significa ser cristão? É juntos desfrutarmos do relacionamento de amor eterno da Trindade para sempre. É por isso que há esse desespero por relacionamento tão bem mostrado no filme Passageiro. Por que Deus enviou o Cristo? Porque Deus amou... “Em amor nos predestinou para sermos adotados como filhos por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade” - Efésios 1:5
Pense de novo na citação de John Stott ao comentar Efésios: “Ninguém pode emergir de uma leitura cuidadosa da carta de Paulo aos Efésios com um evangelho privatizado ou privado. Efésios é o evangelho da igreja. A carta estabelece o propósito eterno de Deus de criar através de Jesus Cristo um povo que se destaca em relevo brilhante contra o fundo sombrio do velho mundo”.
Nada é mais mortal e evidência de não nascimento, do que a expressão tão comum do individualismo doentio de nossa cultura por pessoas que se dizem cristãs... Se tornou comum, contra toda a verdade e necessidade explícita na Bíblia e em nossos corações, a expressão de fuga: “Eu sou a igreja... eu sou cristão sozinho” – Relacionamento? Amor? Juntos vermos a glória de Cristo e juntos amá-lo com amar com que o Pai ama? Como ele orou? Para que eles vejam, amem... eles, eles, eles..
Eu não sou a igreja e você não é a igreja. Você é parte da igreja. A palavra ἐκκλησία ( ekklesia ) significa "assembléia", e não, você não é realmente uma assembléia. Você é um cristão. Se você é um cristão, você tem que ter Cristo como o teu Senhor. Onde está o seu Senhor hoje? Ele descreve a si mesmo como caminhando entre as assembléias locais: “E virei-me para ver quem falava comigo. E, virando-me, vi sete castiçais de ouro; E no meio dos sete castiçais um semelhante ao Filho do homem, vestido até aos pés de uma roupa comprida, e cingido pelos peitos com um cinto de ouro.” - Apocalipse 1:12-13 – “O mistério das sete estrelas, que viste na minha destra, e dos sete castiçais de ouro. As sete estrelas são os anjos das sete igrejas, e os sete castiçais, que viste, são as sete igrejas.” - Apocalipse 1:20
Por entre as igrejas, entre as assembleias, valorizando (segurando em suas mãos os seus pastores) – Por que Jesus é descrito assim em relação a igreja? Porque seu coração está sobre ela e Ele a define. Isso é a igreja, assembleia local de cristãos, pastores... onde a Palavra é pregada, a disciplina exercida como ordena a Bíblia... Cristo amou e se entregou por ela: “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela” - Efésios 5:25 – Você não está ligado a ela, trabalhar nela e orar por ela? Dizer: “Cristo é o meu pastor e eu não preciso...!” – É mera bobagem se o que você está dizendo contraria o ensino bíblico. Quando subiu, Ele deu pastores a igreja ( Efésios 4.11)
Muitas pessoas justificam com críticas e não com argumentos bíblicos viver e ter comunhão com uma igreja local... os argumentos são:
Mas eu tive experiências ruins na igreja (razão acompanhada de detalhes e muitas variadas histórias)!
Mas é muito difícil encontrar uma boa igreja!
Mas eu tenho dificuldade e é difícil para mim me relacionar com as pessoas!
Mas as igrejas às vezes não são simpáticas e acolhedoras!
Mas eu conheci pastores ineptos e incapazes!
Mas Deus jamais me levou a uma igreja local, apenas a internet!
Mas as igrejas muitas vezes não são “relevantes”...
Sejamos sinceros, todas as desculpas juntas tem uma falha fatal. Cada uma delas vê a vida cristã como um processo de negociação para ver se é um bom negócio para mim ou não... cômodo ou não...
Ou seja, não há sequer uma tentativa séria e honesta de mostrar que o propósito de Deus é a não comunhão, o evangelho privado, a não-igreja... Deus diz claramente que o propósito é que estejamos envolvidos, pessoalmente, em uma assembleia local? A resposta tem que ser que , sim... mas então depois a pessoa acrescenta ...mas!
Agora um raciocínio assim seria adequado se Deus fosse um colega debatendo conosco como se fosse nosso colega... mas é totalmente inadequado se Deus é nosso Senhor e nós seus escravos. Nós não debatemos com Deus se a igreja é uma boa ideia. Qual é o teor da nossa relação com as Escrituras? “Se você me ama” – o que? – “Se você me ama você vai me dar uma chance de convencê-lo de que o meu caminho é melhor?” – É isso ou assim que você leu? Mas está escrito: “Se me amais, guardai os meus mandamentos.” - João 14:15
Amar a Deus não é esperar ser fácil, livre de stress e então dar o nosso aval as “sugestões” dEle. Paulo depois de descrever todo o sofrimento exterior em sua vida completa dizendo: “Além das coisas exteriores, me oprime cada dia o cuidado de todas as igrejas” – 2 Coríntios 11.28 – Não! O envolvimento de Paulo com a igreja de Cristo não era simplesmente algo confortável que se encaixava em sua vidinha já determinada por ele como seria.
Se você diz que não precisa estar em uma assembleia local, você diz que é mais esperto do que Jesus, o que na verdade é a mais pura loucura! Cristo disse que o segundo grande mandamento é amar o próximo (Mateus 22.39) – E mandou Paulo te dizer que o seu irmão, membro da igreja, é o próximo em primeiro lugar (Gálatas 6.10). É aí que você toma toda a rica doutrina mostrada em Efésios 1-3, e a vive em comunidade - Efésios 4-6.
Você pode decidir por onde caminhar. Passageiros, se não está mais no cinema, você pode ver por outros meios. E as igrejas locais estão abertas. Por enquanto.
“Em amor NOS predestinou para sermos adotados como filhos por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade,” - Efésios 1:5
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Por: Josemar Bessa
Fonte: Site do autor
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