Filipenses
1:18 é um daqueles clássicos textos que muitos usam para justificar ou
não acusar erros graves no movimento gospel moderno. Mas será que esse
texto dá margem para isso? Afinal, queremos ser bíblicos. Se o texto dá
margem, ok, mas se não, melhor revermos nossos caminhos. Bom,
perguntaram para Augustus Nicodemus sobre isso e ele deu a seguinte
resposta no Facebook:
Um
amigo no Twitter me perguntou se Filipenses 1:18 não justificaria o
evangelho gospel e o show gospel. Acho que ele tinha em mente o festival
gospel na Globo e a hipotética novela da Globo com uma heroína
evangélica.
Para quem não lembra, Paulo diz o seguinte em Filipenses 1:15-18:
“Alguns, efetivamente, proclamam a Cristo por inveja e porfia; outros, porém, o fazem de boa vontade; estes, por amor, sabendo que estou incumbido da defesa do evangelho; aqueles, contudo, pregam a Cristo, por discórdia, insinceramente, julgando suscitar tribulação às minhas cadeias. Todavia, que importa? Uma vez que Cristo, de qualquer modo, está sendo pregado, quer por pretexto, quer por verdade, também com isto me regozijo, sim, sempre me regozijarei” (Fp 1:15-18).
A interpretação popular desta passagem,
especialmente desta frase de Paulo no verso 18, “Todavia, que importa?
Uma vez que Cristo, de qualquer modo, está sendo pregado, quer por
pretexto, quer por verdade, também com isto me regozijo, sim, sempre me
regozijarei” – é que para o apóstolo o importante era que o Evangelho
fosse pregado, não importando o motivo e nem o método. A conclusão,
portanto, é que podemos e devemos usar de todos os recursos, métodos,
meios, estratégias, pessoas – não importando a motivação delas – para
pregarmos a Jesus Cristo. E que, em decorrência, não podemos criticar,
condenar ou julgar ninguém que esteja falando de Cristo e muito menos
suas intenções e metodologia. Vale tudo.
Então, tá. Mas, peraí… em que
circunstâncias Paulo disse estas palavras? Se não me engano, Paulo
estava preso em Roma quando escreveu esta carta aos filipenses. Ele
estava sendo acusado pelos judeus de ser um rebelde, um pervertedor da
ordem pública, que proclamava outro imperador além de César.
Quando os judeus que acusavam Paulo eram
convocados diante das autoridades romanas para explicar estas acusações
que traziam contra ele, eles diziam alguma coisa parecida com isto:
“Senhor juiz, este homem Paulo vem espalhando por todo lugar que este
Jesus de Nazaré é o Filho de Deus, que nasceu de uma virgem, que morreu
pelos nossos pecados e ressuscitou ao terceiro dia, e que está assentado
a direita de Deus, tendo se tornado Senhor de tudo e de todos. Diz
também que este Senhor perdoa e salva todos aqueles que creem nele, sem
as obras da lei. Senhor juiz, isto é um ataque direto ao imperador, pois
somente César é Senhor. Este homem é digno de morte!”
Ao fazer estas acusações, os judeus, nas
próprias palavras de Paulo, “proclamavam a Cristo por inveja e porfia…
por discórdia, insinceramente, julgando suscitar tribulação às minhas
cadeias” (verso 17).
Ou seja, Paulo está se regozijando
porque os seus acusadores, ao final, no propósito de matá-lo, terminavam
anunciando o Evangelho de Cristo aos magistrados e autoridades romanos.
Disto aqui vai uma looooonga distância
em tentar usar esta passagem para justificar que cristãos, num país onde
são livres para pregar, usem de meios mundanos, escusos, de alianças
com ímpios e de estratégias no mínimo polêmicas para anunciar a Cristo.
Tenho certeza que Paulo jamais se regozijaria com “cristãos” anunciando o
Evangelho por motivos escusos, em busca de poder, popularidade e
dinheiro, pois ele mesmo disse:
“Porque nós não estamos, como tantos
outros, mercadejando a palavra de Deus; antes, em Cristo é que falamos
na presença de Deus, com sinceridade e da parte do próprio Deus” (2Co
2:17).
“Pelo que, tendo este ministério,
segundo a misericórdia que nos foi feita, não desfalecemos; pelo
contrário, rejeitamos as coisas que, por vergonhosas, se ocultam, não
andando com astúcia, nem adulterando a palavra de Deus; antes, nos
recomendamos à consciência de todo homem, na presença de Deus, pela
manifestação da verdade” (2Co 4:1-2).
“Ora, o intuito da presente admoestação
visa ao amor que procede de coração puro, e de consciência boa, e de fé
sem hipocrisia. Desviando-se algumas pessoas destas coisas, perderam-se
em loquacidade frívola, pretendendo passar por mestres da lei, não
compreendendo, todavia, nem o que dizem, nem os assuntos sobre os quais
fazem ousadas asseverações” (1Ti 1:5-7).
“Se alguém ensina outra doutrina e não
concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino
segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por
questões e contendas de palavras, de que nascem inveja, provocação,
difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja
mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte
de lucro” (1Ti 6:3-5).
“Eu, irmãos, quando fui ter convosco,
anunciando-vos o testemunho de Deus, não o fiz com ostentação de
linguagem ou de sabedoria. Porque decidi nada saber entre vós, senão a
Jesus Cristo e este crucificado. E foi em fraqueza, temor e grande
tremor que eu estive entre vós. A minha palavra e a minha pregação não
consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração do
Espírito e de poder, para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria
humana, e sim no poder de Deus” (1Co 2:1-5).
Portanto, usar Filipenses 1:18 para
justificar esta banalização pública do Evangelho é usar texto fora do
contexto como pretexto.
Por Augustus Nicodemus Lopes
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