Não há consenso
sobre a origem do Conto de Fadas mais arrebatador da humanidade:
“Ciderella”. A versão mais popular dá conta de que ele é produto do
famoso escritor francês Charles Perrault e teria sido escrito em 1697.
Decerto,
Cinderella é uma história maravilhosa. De suas muitas nuances, uma me
chamou particularmente a atenção nestes dias: a magia que transforma,
momentaneamente, a garota rejeitada e descuidada em uma princesa
estonteante.
Mas tudo na
vida tem um custo... Aquele encantamento, que abria possibilidades e
entretecia sonhos, tragicamente, tinha prazo de validade – dia, hora e
lugar para acabar. E foi assim que, no bom da festa, Cinderella teve de
correr para não se transfigurar na frente de todos e do príncipe, numa
“gata borralheira”.
Como pregador e
pensador deste tempo, percebo um fenômeno que vem acontecendo entre
aqueles que dizem seguir a Jesus e ao Evangelho: o “Efeito Cinderella”.
Trata-se de um tipo de prática religiosa que acaba por tornar o sujeito
um refém da agenda do sagrado.
O Efeito
Cinderella é a crença confinada ao ambiente, a espiritualidade de
ocasião que consagra o personagem, a religião com hora marcada. Neste
tipo de profissão de fé, o indivíduo pensa e age como crente apenas
quando está conectado ao calendário da igreja, num culto, num movimento
ou numa vigília de oração. Nestas circunstâncias, muda o olhar, a fala,
os gestos, os atos, as convicções. Passa a seguir ritos, acredita em
mitos, fala sério, torna-se ético no proceder e ascético quanto ao
pecado.
Contudo, findo o
“efeito mágico”, alterado o ambiente e as ambiências, a pessoa fica
livre para viver conforme sua própria conveniência, entregue a tórridas
concupiscências, dessensibilizado de consciência, amargurado de alma e
petrificado de coração. No fundo, é como se a fé estivesse condicionada
ao acionamento de um botão on/off , que liga e desliga conforme a
ocasião e as circunstâncias.
Com tristeza,
encontro maridos exemplares no Templo, mas que são adúlteros contumazes
no escritório. Vejo gente sincera trabalhando em movimentos, mas
mentindo descaradamente na sala de aula, pudica na EBD e depravada na
mesa do bar. Para nossa vergonha, é a consagração do estelionato
espiritual, a bipolaridade existencial, a dialética religiosa sem
síntese, nem tem propósitos, nem se desdobra de forma consequente.
Bem dizia a
canção consagrada na voz imortal da Elis Regina: “ainda somos os mesmos e
vivemos como nossos pais”. Sim, “nossos pais” adoravam no Templo, por
isso tornamo-nos devotos de espaços pseudo-sacralizados, de geografias
espirituais, batemos no peito diante do altar, mas ignoramos o
necessitado agonizante em nosso caminho, somos sacerdotes que ofertam o
ideal no altar da conveniência.
Mas não
esqueçamos que no grande banquete que nos aguarda, onde estaremos diante
do Rei, não adiantará encantamentos. Naquele dia, não haverá como
esconder a fratura exposta de nossa consciência, atrofiada por práticas
refratárias ao amor. Ali, ou você se revestirá de vestes de louvor ou
trajará trapos de imundice.
Ainda é tempo
de lembrar que Jesus nos desafiou a encarnar um tipo de espiritualidade
que se projeta de ambientes para as dinâmicas do cotidiano. “Nem neste
Templo e nem no Monte”, disse a Samaritana, mas andando em Espírito e em
Verdade! Deus continua buscando gente que não se satisfaça com rotinas
religiosas e que não se torne prisioneiro de catedrais. Sim, para estes,
Ele ainda continua a dizer: “Vem e Segue-me!”.
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Por: Carlos Moreira
Fonte: A Nova Cristandade
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