Jesus, a igreja primitiva e a política
Na época em que o Senhor Jesus vivia na terra, havia grande agitação política. Na tensa situação, o sentimento nacionalista estava vivo e povo sonhava com uma coalizão povo-farizeu-saduceu contra Roma, a opressora dos povos. Em tais circunstâncias, não é de estranhar que o povo esperasse um posicionamento de Jesus no tocante àquela situação calamitosa, ou o seu apoio, quer ao partido nacional, com tendência patriótica e religiosa, quer ao oponente, o partido romano. Em Creta ocasião, representantes dos dois partidos trataram obter uma opinião política de Jesus, valendo-se de uma maliciosa pergunta: “é lícito pagar tributo a César ou não?” (Mt 22:17).Constatamos pela resposta de Jesus que Ele nada tinha a declarar a respeito da política da época. Mostrando-lhes a moeda destinada ao pagamento do tributo imperial, Jesus perguntou: “de quem é esta efígie e inscrição? responderam: “de César”. Jesus disse-lhes: “daí a Cesar o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Mt 22: 20-21). Uma das atitudes importantes de Jesus foi sua imparcialidade política. Ele se recusou a tomar posição a respeito da questão política porque o Reino do Céu não se alcança através da força humana e nem é organizado como reino político. Para alguns, Jesus era um líder piegas e demasiadamente pietista em relação ao problema político. Para outros, Ele era um antipatriota, pois não incitava o povo a luta pela liberdade e a resistir à tirania. Para a grande maioria, Jesus era um alienado, pois só falava de amor ao próximo, enquanto o povo estava faminto, oprimido e sem liberdade política. Mas a verdade era que Jesus estava ratificando, de forma definitiva, a separação entre a igreja e o Estado.
Certa ocasião, Jesus teve uma oportunidade singular: comandar uma multidão entusiasmada e decidida a defender a independência da Galiléia, província do norte da Palestina. O povo estava tão eufórico com o poder do Senhor de Jesus, depois de vê-lo alimentar uma grande multidão com cinco pães e dois peixes que queriam proclamá-lo rei (Jo 6:15). Mas não foi com essa finalidade que Ele veio a esta terra. Jesus não desejava ser arrastado a semelhante movimento e por isso retirou-se sozinho para o monte. Ele não era homem de política. O seu desígnio era servir a Deus e salvar os homens. À oferta da glória política que o diabo ofereceu a Jesus quando lhe disse: “te darei todos os reinos do mundo” ( Lc 4: 6-7), Jesus replicou: “está escrito: ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto” (Lc 4:8). Jesus recusou todos os reinos, porque sabia que há um só reino eterno, do qual Ele é Senhor, todos os demais reinos desaparecerão. Quando Jesus disse: “os pobres vós tendes sempre convosco” (Mt 26:11), não foi comodismo nem alienação de sua parte, pelo contrário, Ele estava apontando para a inevitabilidade da injustiça em qualquer sistema político. Só no Reino do Senhor não haverá pobres, pois todos serão “sacerdotes e reis” (I Pe 2:9).
No início do cristianismo, a escravidão era uma instituição bem estabelecida e de uma crueldade sem limites. Não era difícil imaginar que os crentes fossem chamados a empreender uma campanha pela abolição. No entanto não vemos na Bíblia Paulo e os apóstolos se pronunciarem contra os males da escravidão da época. Paulo e os apóstolos nunca encabeçaram movimentos contra a escravidão. A epístola de Filemom mostra-nos que os crentes da igreja primitiva não moveram um dedo para mudar a situação. Onésimo, escravo fugitivo, converteu-se por meio da pregação do apóstolo Paulo em Roma. Em vez de Paulo aproveitar a ocasião para combater o mal da escravidão, ele faz um apelo espiritual e insiste para que o escravo Onésimo, embora continuasse sendo escravo, fosse agora recebido como irmão, e irmão amado pelo seu amo Filemom (Filemom 10:16). É claro que não podemos ficar indiferentes a um governo opressor e cruel. Mas, lembremo-nos de que o recurso do crente é o próprio Deus, não a agitação, a propaganda política, as petições dirigidas ao Congresso ou a mobilização das massas. O recurso da igreja é entrar na presença de Deus em oração e jejum, depositar diante dEle o fardo que o mundo faz pesar sobre o nosso coração e depois sair para a proclamar as Boas Novas de Cristo aos homens. É importante observar que a escravidão findou no império romano com os crentes praticando o amor tanto ao capataz como ao escravo. A igreja deve se opor às injustiças sociais, não elegendo seus membros a cargos políticos, mas anunciando o Evangelho que é o poder de Deus que transforma aqueles que praticam injustiças.
No livro “On the Road to civilization, a world history”, o historiador J. Sigman relata: “o primitivo cristianismo foi pouco entendido e foi considerado com pouco favor pelos que governavam o mundo pagão; os cristãos não aceitavam ocupar cargos políticos”. O historiador Augusto Neander no seu livro “The history of the Christian religion and church during the first centuries, relata: “os cristãos se mantinham alheios e separados do Estado como raça sacerdotal e espiritual, e o cristianismo influenciava a vida civil apenas desse modo”. A verdade é que muitos líderes estão fazendo a igreja perder a visão para a qual foi chamada. Eles estão tentando a todo custo cristianizar a nossa nação ao modelo de Constantino. Esqueceram que o Senhor Jesus estabeleceu a igreja para salvar o mundo exclusivamente pela Palavra. É engano se pensar que, por meio da política, podemos aprimorar este mundo arruinado. Nunca poderemos produzir crentes pelas leis governamentais. Nunca poderemos cristianizar a sociedade. O homem está em pecado e, portanto, nunca teremos uma sociedade perfeita. Unicamente a vinda do Senhor Jesus irá produzir isso. Os que defendem o ingresso dos crentes na política dizem: “precisamos de crentes na política para angariar verbas para a igreja, do contrário, estaremos perdendo benefícios”. Este pensamento demonstra a falta de fé na providência divina para suprimento das necessidades da igreja. Para estes que pensam desse modo, Jeová Jiré está morto.
Ir. Marcos Pinheiro
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